O poder do capital Mulheres da América Latina são mais exploradas que as do norte global
Foi divulgado na imprensa, dias atrás, situação de extrema gravidade envolvendo diversas histórias de violência e abuso sexual contra crianças e adolescentes.
Os fatos foram praticados por um poderoso empresário, que usava do seu poder econômico para praticar as explorações sexuais.
Morto em 2014, o mencionado empresário conseguia manter forte esquema de aliciamento, onde o dinheiro ‘garantia’ a ocorrência dessas histórias. Segundo narraram as meninas, hoje mulheres, era divulgado que determinado homem ofertava bens materiais e valor pecuniário para crianças e adolescentes em parcas condições financeiras, para aquelas que fossem com ele conversar reservadamente. Elas se dirigiam a uma de suas empresas, eram forçadas a atos sexuais, e ganhavam presentes dele.
O capitalismo fez e faz vítimas todos os dias, sendo inegável a análise desses males quanto aos direitos humanos das mulheres
Empregadas e empregados das companhias disseram que muitas meninas e mulheres compareciam às lojas com bilhetes do multimilionário, determinando que entregassem valores monetários e objetos a elas. Inclusive, muitas violências sexuais aconteceram dentro das próprias empresas. Muitos inquéritos policiais foram lavrados, com provas de orgias e festas utilizadas para assédios e estupros de meninas.
O capitalismo fez e faz vítimas todos os dias, sendo inegável a análise desses males quanto aos direitos humanos das mulheres. Afirma Silvia Federici, em ‘O Calibã e a Bruxa’, que no contexto dos anos 70 estávamos à frente da 2ª onda feminista. Na época, a bandeira feminista envidou esforços tratando da liberdade sexual da mulher e o direito ao corpo. Debates como aborto e sexualidade foram pautas importantes no movimento, com a participação e envolvimento da corrente crítica do feminismo.
Ficou visível que as segundas e terceiras ondas feministas andaram quase que concomitante, sendo responsável pela nova perspectiva do feminismo: o debate de raça e classe. Assim, o marxismo, dentre outras ideologias, se aproximou do movimento feminista, tendo a questão do patriarcado aliada às questões econômicas sugeridas por Karl Marx. Contudo, esta fora uma união que pouco perdurou, porquanto o capitalismo começa a se apropriar dos movimentos identitários na fase de estabelecimento do neoliberalismo, afastando gradativamente a crítica ao capital financeiro do feminismo.
A análise histórica revela que a discriminação e a desigualdade em relação às mulheres no mundo capitalista não é herança do mundo pré-moderno, mas, sim, da construção sobre as diferenças sexuais existentes, tendo como ponto de partida a propriedade privada e o sistema patriarcal.
É preciso refletir sobre a reprodução no mundo capitalista, posto que, a igualdade é difícil de ser alcançada sem a superação do capitalismo. A experiência do ‘ser mulher’ é diferente para cada classe e para cada etnia. Existe uma apropriação das pautas das mulheres, como forma de controle.
As mulheres da América Latina são ainda mais exploradas que as mulheres do norte global. A população brasileira apresenta muitos resquícios da colonização, o que favorece diariamente a nossa mentalidade de exploradas e explorados.
Quando as mulheres entraram na produção e força de trabalho, novas perspectivas foram vislumbradas: o desenvolvimento de uma nova divisão sexual do trabalho; a construção de uma nova ordem patriarcal baseada na exclusão das mulheres do trabalho assalariado e em sua subordinação aos homens; e a mecanização do corpo da mulher, até como máquinas para a produção de novos trabalhadores.
Para Silvia Federici, a história das mulheres é a história de classes, onde a ‘feminilidade’ oculta a produção de força de trabalho no disfarce biológico. O conceito de corpo da mulher apresenta raízes de domínio masculino a da construção da identidade social feminina.
Os casos trágicos mencionados de início guardam prospecção com o capitalismo ao qual a sociedade fica aprisionada. O poder econômico masculino sob o gênero feminino abarca não só a opressão de gênero, abusos sexuais e misoginia, mas o sistema capitalista como um todo, tratando-se de uma situação estrutural. O feminismo precisa ser popular, e não elitista.
Rosana Leite Antunes de Barros é defensora pública estadual
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