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Opinião
Sábado - 01 de Maio de 2021 às 07:45
Por: Auremácio Carvalho

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Já na campanha eleitoral de 2018, o candidato Jair Bolsonaro defendia armar a população para que, segundo ele, os cidadãos de bem pudessem se defender contra o crime e a violência no país.

Deve-se notar que não existe uma arma do cidadão de bem. Primeiro, que o cidadão de bem é de bem até deixar de sê-lo (Diz o ditado: “a ocasião faz o ladrão”).

Muitos casos aparecem na imprensa de mortes banais, de gente armada em bloco de carnaval, gente dando tiro em meio de panelaço, ou que perde a cabeça e atira no vizinho, no motorista no tráfego; ou, ainda, os casos que ocorrem dentro de casa; nas festas e congraçamentos, futebol, etc.

E outro ponto: as armas que abastecem o crime no Brasil são as pequenas, curtas, calibre 38, pistola.40, vendidas legalmente para um cidadão de bem, um colecionador, e que acabam abastecendo um mercado ilegal.

Não existe uma arma do cidadão de bem. Primeiro, que o cidadão de bem é de bem até deixar de sê-lo

O Estado constitui-se, historicamente, a partir de um contrato que diz que nós, indivíduos, entregamos a ele o monopólio da força para que ele provenha a nossa proteção e não precisemos de armas; não vivemos em faroeste.

É ingenuidade das pessoas acharem que portar uma arma significa mais segurança. A violência é um fenômeno social, um problema no Brasil e no mundo, e as experiências mais bem sucedidas combinam duas coisas importantes: repressão e controle do Estado, com ações de prevenção e educação, em uma cultura de paz.

Nem todo mundo está preparado para ter uma arma em casa ou porta-la publicamente.Uma vez no cargo, Bosonaro tratou, então, de liberalizar as regras para aquisição e porte de armas de fogo no Brasil por meio de uma série de decretos.

Entre as novas normas está o direito à posse de até seis armas de fogo em casa ou no trabalho. Os civis agora também têm acesso a calibres que antes eram restritos aos militares ou à polícia e podem comprar muito mais munição. Além disso, também foi abolido recentemente o imposto de importação sobre armas de fogo.

Normas em contestação na Justiça. Dois anos após a posse de Bolsonaro, a idéia é flexibilizar a posse (ter a arma em casa, na empresa ou na propriedade rural, guardada em local seguro ao acesso de crianças, por ex.), mas não o porte (andar livremente com a arma, embora busque-se autorizar), exceto para membros de Forças Armadas, polícias, guardas, agentes penitenciários e empresas de segurança privada, estes no expediente de trabalho, entre outros, é assunto complexo face a realidade brasileira.

Senão, vejamos: cerca de 06 armas são vendidas por hora no Brasil, em lojas especializadas, segundo dados do Exército. Passamos de 620.000 armas em circulação no Brasil em 2018, para 1.125.000 em 2020.

Especialistas afirmam que a quantidade de armas total disponível no país, segundo estimativas, pode chegar a ser 10, 15 vezes maior; pois, neste montante, não estão, por exemplo, armas ilegais do crime organizado ou simplesmente armas não registradas e armas nas mãos de civis: 619.604; a maioria, não registrada, mas legais.

A posse de armas atualmente no Brasil é regulamentada pela lei federal 10.826, de 2003, conhecida como o Estatuto do Desarmamento. De acordo com ela, são necessárias algumas condições para que um cidadão tenha uma arma em casa, como ser maior de 25 anos, ter ocupação lícita e residência certa, não ter sido condenado ou responder a inquérito ou processo criminal, comprovar a capacidade técnica e psicológica para o uso do equipamento e declarar a efetiva necessidade da arma.

Critérios que o governo busca ignorar na sua ânsia ou psicose de armar a população, na ilusão da autodefesa, eximindo-se as forças de segurança de seu papel de defesa do cidadão e seu patrimônio. Bolsonaro passou a relacionar o acesso a armas à democracia, argumentando que só com armas a população poderia resistir a uma ditadura.

"Povo armado jamais será escravizado", disse, na reunião famosa ministerial de abril de 2020. Pesquisa Datafolha feita no mês seguinte mostrou rejeição de 72% dos entrevistados a essa afirmação. Há no discurso oficial uma negação do Estado moderno, em que o monopólio do uso da força está nas mãos do governo, que o exerce por meio de suas forças policiais, conforme prevê a Constituição. Em vez de fortalecer as polícias e controlar os excessos, você entregar armas para o cidadão fazer o papel de polícia é desacreditar a função do Estado moderno de buscar exercer o monopólio legítimo da força em defesa da coletividade e entrega-lo ao cidadão anônimo e despreparado para tal missão.

O problema não são as armas para defesa pessoal, mas ampliar a presença de armas num momento de grave crise sanitária e econômica – o que acabaria por beneficiar grupos fanáticos e criminosos.

Não é momento de armar a população, mas de vacinar e resolver o problema da pandemia. A Atuação das milícias e da violência no Rio de Janeiro é emblemática nesse debate. Temos 700 comunidades, onde o Estado não chega, porque dominadas por grupos fortemente armados, uma espécie de subprefeituras armadas. No referendo brasileiro de 2005, a maioria da população se manifestou a favor do direito de comprar uma arma (65%). Pontos contrários?

A circulação de armas vai aumentar – e mais armas significam mais mortes; - levantamentos mostram que a maior parte das armas de fogo utilizadas em ocorrências criminosas foram originalmente vendidas de forma legal a cidadãos autorizados, que depois tiveram a arma desviada ou subtraída.

O poder público se omite e entrega o cidadão à própria sorte; - mais armas em casa trazem riscos de acidentes com criança, suicídio, briga de casais e discussões banais. A Associação dos Oficiais da Reserva da PM no Brasil fez uma declaração perigosa: “A questão não é a arma, a questão é cultura. O povo tem o direito de ter uma arma até para se rebelar contra a tirania ainda mais contra um criminoso que entra na sua casa.” Contra a tirania, a nossa arma é o voto, acredito.

Dados mostram (Fórum Brasileiro de Segurança Pública) que se trata de uma aposta na violência, uma vez que existem evidências robustas dentro do debate sobre segurança pública que, quanto mais armais, mais crimes, ou seja, 94,9% das armas apreendidas em 2019 não foram cadastradas no sistema da Polícia Federal (SINARM) e 13.782- (11,5%) armas legais foram perdidas, extraviadas ou roubadas.

Acredito que precisamos tratar esse assunto de forma menos passional ou política:

1- Onde está a segurança pública que todos merecemos?

2- Mais educação, saúde, lazer, renda, não ajudaria na resolução do problema da violência urbana? A autossensação de poder, por conta própria, se defender, é real?

Políticas públicas de Estado e não de governo, é uma das soluções ao problema da violência. Por qual razão uma pessoa teria seis armas em casa, um número tão substancial de munições, se não fosse para ser usada em atividade escusa e potencialmente criminosa?

Auremácio Carvalho é advogado.



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