Pacientes ou clientes? Algumas práticas passam a ser analisados sobre ótica mais questionadora
Com a crescente demanda pela humanização dos sistemas de saúde, algumas práticas e termos rotineiros passam a ser analisados sobre uma nova ótica, mais questionadora. Um ponto talvez nunca questionado se tornou fonte de debate: quem usa um serviço de saúde é paciente ou cliente?
Essas duas denominações influenciam como a pessoa será abordada e cuidada, com vantagens e desvantagens.
Nós, médicos, historicamente utilizamos o termo paciente. Essa escolha pode carregar a imagem equivocada de que quem procura uma unidade de saúde deve estar conformado em esperar, aguardar, sendo paciente com qualquer atendimento que venha a receber.
De maneira alguma o vocábulo é o causador dos péssimos serviços públicos e particulares que recebemos, eles são ruins por falta de competência ou recursos, mas é uma triste coincidência cobrar de pacientes que tenham paciência.
A verdade é que bons profissionais enxergam o paciente como alguém momentaneamente fragilizado, que precisa de amparo, em uma visão individualizada e respeitosa.
Algumas práticas e termos rotineiros passam a ser analisados sobre uma nova ótica, mais questionadora
Em contraposição à paciente, surge a imagem do cliente.
O cliente tem um papel muito mais ativo na relação de cuidado, ele é melhor atendido, afinal, ninguém quer deixar um cliente esperando.
Todo estabelecimento quer atender as necessidades dos clientes, pois esse tem escolha de buscar outro prestador de serviço, melhor e mais eficiente.
Essa visão tira da zona de conforto aqueles que não se importam com a qualidade do atendimento, e se você já utilizou serviços de saúde, sabe do que estou falando. Clientes fazem reclamações, exigem, elogiam e participam da construção do serviço que é feito para eles.
O ponto de conflito acontece porque com o paciente as orientações médicas podem, eventualmente, contrariar suas expectativas, mas são para o seu bem. O cliente não pode ser contrariado, ele é um consumidor, o pagador, e no comércio, o cliente tem sempre razão.
Quando pacientes exigem que seja feito um exame ou que seja prescrito um antibiótico, eles estão agindo como clientes exigentes e podem tomar péssimas decisões, pois simplesmente não detém conhecimento em saúde. Nesse momento, a autoridade do carimbo precisa se impor e ser respeitada, goste ou não.
Sua avó sabia que para perceber febre o melhor era colocar a mão sobre a testa e todo paciente é orientado a medir sua temperatura nas axilas. É impossível detectar febre a partir da temperatura das mãos, então lojas, shoppings e locais de trabalho que fazem isso não priorizam sua saúde, eles querem te agradar como a um cliente.
Ao procurar orientação e tratamento existe a chance de ser contrariado, alguns remédios são amargos, mais necessários. Trazer a lógica do comércio e exigir medicamentos e exames como quem vai à padaria certamente te fará mal.
Pacientes merecem respeito, serem ouvidos e bem tratados. Hospitais, clínicas e profissionais precisam atender melhor seus clientes, nós já percebemos isso.
Progressivamente os serviços de qualidade vão ganhando espaço. Seja exigente, mas tome cuidado, pois clientes impacientes correm o risco de receber o que querem ao invés daquilo que realmente precisam.
Manoel Vicente de Barros é psiquiatra em Cuiabá.
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