A Necrópole da Covid-19: a invisibilidade dos despossuídos A pandemia é inequivocamente desigual nos seus impactos sociais
A pandemia é inequivocamente desigual nos seus impactos sociais. Basta observamos os resultados educacionais em que a população de baixa renda não tem acesso a internet de qualidade, nem na infraestrutura quanto na conectividade – pobreza digital – e consequentemente a um ensino/aprendizagem que garanta conhecimento e qualidade a distância.
O fechamento de escolas e creches combinado com a pobreza digital são inequivocamente trágicos. Riscos e repercussões são abundantes ao atraso no desenvolvimento de habilidades motoras, da saúde mental e depressão, à reversão da paridade de gênero. Todos esses obstáculos podem levar a atrasos cognitivos e desenvolvimento social e emocional.
Além disso, os mais pobres são muito mais vulneráveis aos choques econômicos e de saúde na pandemia. E quando focamos nas crianças a preocupação aumenta, pois, os primeiros anos de uma criança são essenciais para determinar os resultados na vida adulta. A adição de aprendizagem formal torna-se vital no final da infância e adolescência para determinar os resultados da vida na fase adulta.
Ainda existe para os despossuídos condições de vida limitadas, violência doméstica, redução de alimentos – aportes nutricionais – comprometimento do bem-estar físico e mental. Interação social e comunitária restrita são outros fatores que culminam na exclusão social.
A pandemia é inequivocamente desigual nos seus impactos sociais
Cada dia que passa, a pandemia do Covid19 que aqui chamo de “pandemia da desigualdade” prejudica ainda mais as chances da melhoria da qualidade de vida dos mais jovens e principalmente da população de baixa renda – os pobres e despossuídos – e, consequentemente, compromete as perspectivas de um crescimento inclusivo e sustentado de desenvolvimento social, econômico e ambiental.
Se faz extremamente necessária e urgente uma ação política forte e robusta baseadas em dois elementos principais: (i) programas e infraestrutura diretamente relacionados a educação, ao saneamento básico e ambiental, incluindo inclusive programas de transferência de dinheiro; e (ii) é imprescindível desenvolver ações de sensibilização/mobilização/capacitação social que possibilitem a compreensão sistêmica que a questão exige, estimulando a participação popular, com o intuito de conscientizá-la e comprometê-la com o enfrentamento dessa questão.
Importante salientar que o município de Cuiabá está revendo seu Plano Diretor. O Plano Diretor é o mecanismo legal que expressa o projeto do município que queremos. E suas diretrizes de ações visam promover o desenvolvimento sustentável, a melhoria da qualidade de vida da população e o bem-estar de toda a comunidade. Ele se transforma em lei máxima de um município.
A pergunta que não quer se calar é: existem diretrizes nele contidas para a recuperação social, econômica e ambiental pós pandemia do Covid-19, que incluem a melhoria da qualidade de vida da população e o bem-estar de toda a comunidade?
A pandemia é um dos mais graves desafios que Mato Grosso já enfrentou, com custo elevadíssimo em termos de vidas humanas. Com esse alto custo e a profunda crise da saúde, Mato Grosso irá testemunhar um impacto severo no bem-estar de grande parte da população, principalmente de baixa renda, ao longo dos anos que virão.
A crise gerada pela pandemia interage com a heterogeneidade na capacidade de geração de renda, condições de trabalho, acesso a serviços públicos e muitos outros aspectos que tornam alguns indivíduos e famílias particularmente vulneráveis. Dentre eles podemos destacar: pessoas nos mercados informais, pequenos e microempresários, mulheres em condições precárias de trabalho, grupos historicamente excluídos, como indígenas e negros.
Estes citados deveriam estar no centro da resposta política, mas até o momento não estão…
O que vemos na mídia são notícias sobre “Corrida Eleitoral” onde citam nomes de possíveis candidatos de vários partidos, mas esses candidatos não apresentam propostas factíveis ou não para solucionar a “invisibilidade dos despossuídos” neste momento tão crucial de pandemia.
São verdadeiros políticos alienados das questões sociais, econômicas e ambientais que envolvem a questão. Qual o projeto político deles para pós pandemia?
O ex-governador dos EUA, Ben Bernanke, nos lembra em seu livro “The Courage to Act” que durante as crises, as pessoas são distinguidas por aqueles que agem e aqueles que temem agir. O que percebo é que grande parte dos nossos políticos temem em agir. Se alguma vez houve um momento sem precedentes para agir, é indiscutível, que este momento é agora.
O desafio lançado para aqueles que possuem capital político e financeiro é este: em vez de preparar o terreno para um cemitério em massa, construa as bases e invista em infraestrutura social, de saneamento básico e ambiental. Invista na educação em todos os seus dois níveis: a educação básica – formada por três etapas – educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, e no segundo nível, na educação superior.
Por meio da educação é possível formar cidadãos conscientes, críticos e capacitados para viver em sociedade. Quando se investe em educação, se tem uma população preparada para encarar os desafios cotidianos em todas as áreas, inclusive em pandemias.
Como Arquiteto e Urbanista tenho que salientar que o processo de planejamento e sua transformação acontecem no momento em que a sociedade, ao olhar de forma crítica para os aspectos que influenciam sua qualidade de vida, reflete sobre os fatores sociais, políticos, econômicos e ambientais que originaram a situação atual e, ao corrigir o caminho, busque modificá-los de forma a melhorar a qualidade de vida da população, principalmente daqueles que são “despossuídos” e não tem voz.
Importante salientar que o próximo ano é um ano eleitoral e precisamos votar naqueles que se distinguem dos politiqueiros que só trabalham em causa própria e, desta forma, a favor da necrópole do Covid19, por aqueles que efetivamente agem em prol da sociedade democratizando as decisões para transformar o planejamento da ação em trabalho compartilhado entre os cidadãos para uma recuperação social, econômica e ambiental pós pandemia.
Eduardo Chiletto é arquiteto e urbanista.
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