Depressão e Segurança Pública No imaginário coletivo, ao menos a meu juízo, ser policial é algo grandioso
No imaginário coletivo, ao menos a meu juízo, ser policial é algo grandioso pois em tese a sociedade tende a enxergar a figura do policial como um herói que irá proteger a todos do homem mau. Encarna-se no policial a figura de cumpridor da lei e protetor de quem tem o seu direito lesado. Talvez tudo isso seja parte da verdade.
Mas eu quero refletir sobre as enfermidades que se abatem sobre nós ao longo dos anos exercendo essas atividades de riscos e tão fundamentais para a manutenção da ordem constitucional.
Ao longo dos anos, a gente vai lidando com tantas maldades, desumanidades, desgraças alheias, etc., que vamos perdendo nossa humanidade dia após dia. Sim não somos homens ou mulheres de ferro, somos pessoas e somatizamos em nosso corpo e mente todas as mazelas que enfrentamos no atendimento a sociedade.
No imaginário coletivo, ao menos a meu juízo, ser policial é algo grandioso
Não estou aqui procurando culpados ou demonizando nenhum trabalho, a minha intenção é refletir sobre a realidade e o preço que se paga por ser quem somos. Muitos de nós nos tornamos alcoólatras e depressivos e passamos a depender de medicamentos tarjas pretas para seguirmos adiante.
Atrás daquela linda camiseta preta ou fardas diversas que usamos com orgulho, não raramente há uma alma destruída, fragilizada pelas inúmeras barbaridades que viu e viveu ao longo dos anos no exercício da função.
Muitos tiram a própria vida por não suportarem o fardo e é preciso olhar para essa problemática e não tratá-la como um fato isolado ou coisas do acaso. Recentemente eu perdi uma amiga e tem sido um processo muito doloroso para todos nós. Mas mesmo em luto e com os corações despedaçados, a gente continua, sendo o que somos, tirando forças de onde não se tem, mas prosseguimos fazendo o que “romanticamente” escolhemos fazer.
É de notório conhecimento que morremos mais em virtude do suicídio do que em combate, um dado alarmante. E o que se tem feito por parte do estado para mitigar os danos colaterais causados por doenças psicológicas tratáveis?
Quando entramos aqui, conhecíamos os riscos, sabíamos que o tempo traria consequências para a nossa saúde mental. Hoje me perguntam, porque você não sai, tudo isso vale a pena? Eu me sinto de alguma forma como um soldado que mesmo achando a guerra uma barbárie, quer estar lá, pois já condicionou a sua existência a essa dose de adrenalina regada por todas as desgraças e sofrimentos alheios. E assim a gente continua.
É obvio que para quem não é capaz de ver a morte de uma galinha, nossa rotina pode parecer uma molezinha, mas só quem já ajuntou pedaços de um semelhante em uma cena de crime, ou teve de lidar com um inquérito de violência sexual contra crianças impúberes compreenderá o tamanho dos desafios que se avolumam diante da condição de ser policial.
É preciso um olhar criterioso para entender o porquê muitos policiais perdem o controle das próprias vidas. As vezes não é só uma questão de escolhas, mas sim a manifestação de doenças psicológicas causadas pela rotina pesada ou simplesmente uma alma doente pedindo socorro.
Joel Mesquita é sociólogo e policial judiciário civil.
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