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Opinião
Sábado - 18 de Dezembro de 2021 às 09:45
Por: NEILA BARRETO

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Quando dezembro chega, Cuiabá ganha ares natalinos como todas as cidades brasileiras. Por toda parte a decoração anuncia que estamos em tempos de confraternização, em tempos do nascimento do menino Jesus.

Os motivos natalinos relembram o nascimento de Jesus Cristo. Mesmo nestes períodos de pandemia.

Segundo o historiador Lenine de Campos Póvoas, em uma Cuiabá das décadas de vinte e trinta as festas de final de ano eram intensamente comemoradas. A diferença daquela época para a de hoje é que atualmente as festas têm um cunho eminentemente social, ao passo que outrora se revestiam de um sentido religioso e familiar.

O Natal era também data festejada em ambientes estritamente familiares. Após o comparecimento às cerimônias religiosas nas diversas igrejas da capital, as atenções se voltavam para as crianças e para a figura do Papai Noel.

Neste ano, em função da pandemia, a comemoração natalina, por segurança, deverá seguir os nossos antepassados. Muitas comemorações se darão em ambientes familiares. Alguns em restaurantes da cidade de forma cuidadosa e seguindo os protocolos da pandemia.

Em época de pandemia que nos castiga, até na família o Natal será menos intenso. A reunião familiar deve ser restrita, até entre os membros da própria família. Todo cuidado será pouco. É um cuidando do outro e, todos cuidando de todos.

Uma tradição que marcava o Natal na Cidade Verde eram os presépios armados em inúmeras residências, abertos à visitação pública desde as vésperas do dia 25 de dezembro até à noite de Reis, no dia 6 de janeiro.

Dezenas deles constituíam atrações nos vários bairros da cidade, reproduzindo a adoração do Menino Jesus pelos Reis Magos e pelos pastores na manjedoura de Belém. Para o historiador Lenine de Campos Póvoas, o tamanho dos presépios, o número de figurantes, os animais que apareciam, a beleza do cenário, tudo variava de acordo com a imaginação, a habilidade e o gosto artístico dos que o projetavam e montavam.

Muitas das figuras eram feitas de barro pelas próprias pessoas das residências em que eram armados. Outras de palhas.

Deodato Arruda, nascido em 1926, funcionário público aposentado, morador da Avenida 15 de Novembro, no bairro do Porto, na capital, já falecido, era um dos confeccionadores de presépios em Cuiabá. Ele dizia que durante quinze noites que duravam a exposição dos presépios, uma das distrações da moçada era sair em grupos para “correr presépios”. Deveriam ser visitados pelo menos sete para dar sorte.

Hoje não temos mais Deodato entre nós. Hoje não corremos presépios!

Deodato de Arruda iniciou a confeccionar presépios ainda muito jovem juntamente com um amigo chamado José Teixeira. Entre os anos de 1935 a 1949 faziam com papelão, barro e materiais artesanais as figuras para representar e alegrar o Natal, inclusive com a colaboração dos demais moradores.

Depois, na década de 1940, passou a confeccionar os presépios com o amigo, um trabalho mais elaborado. Mas durou apenas até 1949. Já em 1974, Deodato começou a mudar o presépio colocando movimentos à base de eletricidade, acrescentando figuras maiores e, também, de animais regionais que encantavam sua casa e a todos que por ali passavam.

O encantamento do presépio de Deodato seguiu viagem com ele para a morada de Deus Pai. Hoje o seu presépio brilha no céu.

“Seu” Deodato contava que confeccionar o presépio era notável, tanto pela sua montagem como pela motivação dos personagens, movidos à eletricidade, onde as crianças e os adultos ficavam encantados com as suas cascatas, o pássaro que voava sobre a Lagoa, o pescador que fisgava o peixe, a mulher que socava o pilão, o homem que rachava a lenha, os rapazes que serravam madeiras e muitas outras figuras que se moviam em um lindo cenário sobre o qual aparece um lindo luar.

Conforme memórias do professor Lenine Póvoas, havia em Mar Del Plata, na Argentina, um presépio desse gênero, permanentemente montado num colégio religioso, considerado “atração internacional”.

“Já o vi por duas vezes e posso afirmar que o do Sr. Deodato de Arruda não lhe fica atrás em beleza e engenhosidade”, afirmou Lenine em suas memórias.

Mais do que um presépio, a estrutura montada por Arruda até o ano 2001, no bairro do Porto, em Cuiabá, é um registro histórico e cultural da vida dos moradores da cidde, que fez colorir a infância de milhares de crianças mato-grossenses.

Além do presépio de Arruda, na Avenida 15 de Novembro, havia os presépios das casas do farmacêutico Arsênio de Morais, de Dona Petita, da Professora Carlina Moreira, este montado na residência de seu pai, o Cel. Antônio Maria Moreira (ex-Intendente Municipal) - prefeito.

No final da Rua Barão de Melgaço havia o do “seu” Freitas, próximo ao Largo da Mandioca (centro) da capital, cujas memórias registramos em função de que partiram para outra morada. Conforme a historiadora Juliene Barbosa da Mata, em Cuiabá também havia o presépio do “seu” José Gonçalo de Jesus, nascido em 1942, já falecido, professor aposentado, filho de carpinteiro, que aos oito anos de idade já confeccionava com papéis e massas o presépio que, neste período, era aberto em sua casa às visitações públicas.

José Gonçalo contava que principalmente as moças solteiras seguiam fielmente a lenda que se visitassem sete presépios e furtassem uma pedra logo se casariam.

Professor Zezinho, como era conhecido, guardava com carinho um presépio particular para amigos e sua família. Com o falecimento do professor Zezinho, seu sobrinho Arners Sukdorf vem dando continuidade e vida ao presépio cuiabano, para a alegria das crianças e jovens da cidade que não teriam a oportunidade de conhecer a sua arte: o presépio natalino.

O senhor José Brasil, já falecido, possuía um presépio muito visitado na capital, ali no bairro Mundéu, onde todos os personagens possuíam movimentos, os quais encantavam adultos e crianças.

A professora Elza Oliveira, moradora e nascida no Porto, participava sempre da missa do Galo, à meia-noite, celebrada na época na Paróquia São Gonçalo e demais igrejas, onde cantavam inúmeras músicas natalinas, recordou para a historiadora, o cultivo da pitomba nos quintais cuiabanos, fruta que enfeitava muitos presépios seguindo aquela tradição.

Por fim, também não podemos esquecer-nos de Margarida Pinto Figueiredo, aposentada deficiente auditiva, já falecida, filha do morador tradicional Francisco Pinto de Figueiredo e da senhora Argemisa Pinto. Margarida, mesmo surda e muda, estudou e escrevia corretamente e, possuía uma letra belíssima, fabricou seu presépio por 60 anos, na Rua 15 de novembro, quase esquina da beira do rio Cuiabá, do lado direito de quem desce a rua, fazendo com material reciclado, argila e movimentos nos figurantes do presépio onde transmitia aos visitantes seus sentimentos, alegrando os corações e enchendo os olhos de todos com a magia do Natal, ajudados por Tiná e Catuto, que também eram deficientes auditivos.

A casa de Margarida ficava em frente à casa do pai de Ivens Scaff, seu Hid Alfredo Scaff. Pena que esses Presépios e esses artesãos não existam mais.

Em época de pandemia, ficamos apenas com as lembranças. No entanto, os cuiabanos e visitantes poderão visitar os presépios montados na Arena Pantanal “Governador José Fragelli, no bairro Verdão, idealizado pelo governo de Mato Grosso, e a Casa do Papai Noel, na rua Rússia do bairro Santa Rosa.

O idealizador, o advogado sulista Baltazar Ulrich, conta que segue a tradição da sua mãe, e quando chegou aqui trouxe o costume da família, porque depois das filhas veio os netos, a razão que continuou para não perder o significado da magia do natal, família reunida, fé e a presença de menino Jesus na Ceia de Natal em nossa vida. Feliz Natal! Bom Ano Novo!

Neila Barreto é jornalista, mestre em História e membro da AML.



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