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Opinião
Quarta - 05 de Janeiro de 2022 às 06:36
Por: Lousdembergue Rondon

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O amor só pode vir da admiração das virtudes e qualidades do outro. Esta admiração só pode ser conseguida caso aquele que admira tenha humildade. A humildade vem através da sabedoria ao reconhecer as próprias limitações e dificuldades. Este reconhecimento só pode vir com o contínuo esforço por tentar melhorar e alcançar novos patamares. E para isso é necessário um objetivo. Esta meta só pode vir através de uma intrínseca e legítima determinação.

Para o filósofo grego Aristóteles (384 a.C.), as virtudes morais se encontram entre a ‘deficiência’ e o ‘exagero’, estes dois extremos chamamos de ‘vícios’. Nas virtudes se encontram (na minha interpretação) a coragem, moderação, dignidade, honestidade, sabedoria, amabilidade, animação, agir consciente, ser justo, ser bondoso e ser esforçado.

Afirmo que na camada mais profunda da Vontade deve existir uma busca pela perfeição e a rejeição do defeito e das limitações do corpo e da mente. Deve haver alguma miúda parte no cérebro responsável por algum tipo de ligação a uma entidade divina. Esta recusa das limitações é inerente à adaptação da mente do ser humano.

Em todo caso agora resta saber as origens e consequências do amor, e sabemos. O amor é a principal formadora da sociedade porque ele consegue estabelecer conexões fortes o suficientes para a união da família e das pessoas. Este assunto foi bastante debatido no meu texto 'Em defesa da vida após a morte'. Aos leitores interessados em relacionamentos, poderão encontrar um conteúdo decente no meu artigo ‘Em defesa da atração - O que torna as pessoas sexualmente atraentes?’, onde debato o aspecto físico e comportamental da sexualidade.

Sobre o divino… em suma o amor parte de um grande interesse em expandir as limitações do corpo e da mente, é muito comum se ouvir em relação a um casal “se tornar apenas um” sob a testemunha de Deus. Perceba que esse sentimento de se ‘tornar apenas um’ revela um descontentamento com a prisão do próprio corpo e essa extensão do do ‘eu’, que seria impossível, torna-se possível através de um fator “divino” (sobrenatural). E o amor não está apenas relacionado com o casal, mas abrange os filhos e demais integrantes da família.

Nós vivemos a vida inteira dentro da nossa própria cabeça e percebendo o mundo de acordo com a nossa própria visão – por isso seria impossível ver as coisas mais próximas a nós como “outras coisas”, temos um desejo enorme de fazê-las serem parte de nós. E isso ocorre. ‘Eu’ me torno a minha esposa; também me torno meus filhos, me torno a minha família e mais adiante me torno a minha comunidade. Não tenho uma esposa, sou a minha esposa, assim como sou os meus filhos, sou a minha família e sou a minha comunidade.

Um ataque a essas coisas seria um direto ataque a mim. Da mesma forma que a felicidade da minha esposa se torna a minha felicidade; a felicidade dos meus amigos se torna a minha felicidade. Isso é tão real quanto é possível ser, ou ainda mais real do que é possível. Apesar de sermos construídos da matéria, transcendemos a nossa natureza física, somos dotados de uma mentalidade necessariamente superior com fundamentos arraigados na sapiência do divino. E isso não é conscientemente discriminado, mas extremamente sentido.

O corpo e a mente são uma prisão e estamos sempre desesperados para escapar dessa prisão. Estamos sempre desesperados para fazer parte de algo superior à nossa condição, de amar, de sermos amados; uma sede mortal por algo infinitamente mais elevado do que a nossa própria condição humana. E isso explica muita coisa, aliás essa discussão vai para além de temas como o amor. Mas uma característica bastante peculiar do amor é a tamanha possibilidade de união. E esta união é fundamental para construção de uma comunidade.

Bom, só para tirar o elefante da sala, o amor é uma resposta biológica que busca a sobrevivência da espécie e da genética; portanto esta forte ligação possibilitaria uma sobrevivência maior porque seríamos animais que viveriam em tribos e os indivíduos destas tribos nos ajudaria a viver; e unidos nos defenderíamos dos inimigos. Os naturalistas ainda poderão continuar a dizer que o amor de um casal é um ritual de acasalamento que fornece as condições necessárias para continuação da genética dos indivíduos e também na criação dos filhos.

E é bastante óbvio que este pensamento não está errado; mas não serei tão infantil a me contentar com um raciocínio bastante ingênuo. Eu prefiro tentar descrever aquilo que não consigo colocar em palavras e nem mesmo organizar o pensamento de maneira mais simples. Provavelmente o leitor terá o trabalho de continuar este texto por conta própria assim que eu parar de escrever. Porque há muito o que se falar a respeito do amor.

Mas o que talvez os naturalistas e materialistas possam não entender é a profunda ideia de conservação e um compartilhamento milenar de uma estrutura social; o ato de ser responsável em transferir princípios, costumes e valores para pessoas que ainda nem nasceram. A ideia de que, se meu corpo dura cem anos, preciso garantir que os meus valores e a sociedade durem por milênios. E somos um elo de uma grande corrente eterna e nos esforçamos para isso.

Resumir tudo isso num simples ‘comportamento animal’ é apelar para a ignorância e recusar ver a verdade. A verdade é que existe algo superior a condição humana, algo que está no núcleo do nosso ser. Que talvez não possa ser descrito, mas pode ser facilmente sentido.

Somos aquilo que acreditamos e somente pelo que somos, nos sacrificamos. Mas nem todas as ideias são dignas ou levam ao sacrifício. O sacrifício precisa de algo mais importante, algo que sem, nós não existiríamos. Algo que é intrinsecamente mais importante que a matéria da qual somos compostos. Uma fórmula para vencermos o materialismo e nos concentrarmos em algo verdadeiramente importante.

A palavra “sacrifício” que uso neste texto se refere a qualquer tipo de “renúncia de algo” ou “oferta de algo”. Entre os sacrifícios podem ser encontrar os mais extremos, como da própria vida em defesa daqueles que amamos. Ou menores como o investimento do nosso tempo e energia naquilo que amamos. O sacrifício é sempre no sentido de renunciar a “algo não tão significante” em comparação a algo “mais significante”.

O ser humano é sedento por encontrar algo significante. Que sem esse ‘esse algo significante’ a vida não tem sentido e se acorda todos os dias e se trabalha todos os dias por uma simples e medíocre atitude cotidiana. Porém isso é incapaz de trazer significado à vida e tampouco é capaz de preencher a alma com um sentimento de que somos parte de algo mais importante que nós mesmos.

Somos criaturas dispostas ao sacrifício; e mais do que isso precisamos encontrar o motivo do sacrifício ou não nos encontraremos. Pelo amor podemos matar ou morrer; mas jamais faríamos isso por um trabalho com carteira assinada e férias garantidas. Mas o amor precisa ser algo simples o suficiente para abranger todos os tipos de pessoas e atingi-las sem que as mesmas possam imaginar.

Se alguém chega até mim e me explica a conexão entre o sacrifício na vida, a recompensa mais valiosa que esta vida e me diz “Amai-vos uns aos outros” então presumo que esta pessoa deve entender profundamente a natureza do ser humano e interpretar e dar significado a nossa essência sedenta por algo superior. E diante de tamanho conhecimento nada posso acrescentar.

Naquilo que compõe a mente, o amor é provavelmente uma parte importante da estrutura mental; bastante próxima da sobrevivência e tem uma profunda influência no comportamento, nos desejos, desempenha um papel fundamental na conexão com as outras pessoas e na forma com que a pessoa interage consigo e com o mundo. Por consequência influencia a autoestima, as ações e motivações.

O poeta português Luiz Vaz de Camões, em um soneto, entendeu algo bastante interessante sobre o amor: “É querer estar preso por vontade”. Com este verso ele sabe que o amor é essencial e desejado. ‘Estar preso’ é necessário porque no fundo é absurdo imaginar que o ser humano possa viver em ‘total liberdade’.

Nós precisamos de âncoras que nos prenda e nos norteie, porque seria impossível tomar decisões específicas sem ter o essencial já estabelecido. Aquele que ama e é amado encontrará maior liberdade que os demais. Sobre este assunto o leitor poderá encontrar maiores informações no meu artigo ‘8 argumentos a favor do casamento’.

Outro verso do mesmo poema, “é servir a quem vence, o vencedor”, o que significa a palavra ‘servir’? A palavra não diz respeito a ser escravo, mas sim em se sacrificar por algo mais elevado do que os interesses mundanos, superficiais.

E ‘quem vence’ não é uma pessoa, mas sim o próprio amor que se torna uma ‘instituição’ ou parte necessária para uma instituição, como o casamento, família, paternidade ou amizade. Ao fazer este sacrifício, você ganha algo mais valioso, mais importante e que lhe trará maior paz e sucesso a longo prazo.

O amor é um gigantesco investimento contínuo em que se tem muito a perder e muito mais a ganhar. Com sorte e muita sabedoria você terá escolhido o melhor caminho para uma vida calma e preenchida; com uma base estrutural que estabilizará o seu caminho em face aos grandes desastres, perdas, infortúnios, doenças e crise financeira. Não te poupará do sofrimento, mas aliviará a sua alma tão tremendamente que sempre ganhará fôlego para continuar a andar.

Defino o amor como uma forma de querer se tornar uma pessoa melhor, por isso os arrogantes e egocêntricos jamais amarão, pois pensarão que nada poderão aprender com o outro. A ideia de que existe algo maior do que o ser humano é requisito para se amar. Quem ama inevitavelmente acaba por fazer o bem ao próximo. Sobretudo aquele que ama precisa ver o amor como algo bastante significativo, em ocasiões, mais importante que a vida. E para isso é necessário haver um sentimento de pertencimento. O amor é uma das conexões extremamente fortes e não visíveis que liga o ser humano ao mundo e cria uma estrutura para a vida.

Por mais tempo que eu possa ficar a imaginar, este assunto está além da minha compreensão. Tenho certeza que não conheço a maioria das coisas que regem este mundo; existem forças não visíveis que moldam a vida e são essenciais para formação e sustentação do ser humano; e neste caso as dúvidas de quem sou e porque faço as coisas que faço continuarão; as que forem fáceis de serem interpretadas em infinitos devaneios poéticos jamais deixarão de me perturbar. As minhas palavras terminam aqui. Deixo o leitor para continuar a escrever este texto, mesmo que apenas em pensamentos.

Lousdembergue Rondon é jornalista.



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