Arrependida? Eu?
Bom dia, e bem-vindos ao meu, ao seu, ao nosso “Se eu tivesse pensado mais um pouquinho…”. Ao leitor, o lembrete, essa é uma obra de ficção e qualquer semelhança com a realidade, é (ou não, sei lá) fruto de coincidência.
Se eu tivesse pensado mais um pouquinho, não teria me matriculado numa formação longa, aos sábados, das 9h às 18h. Todo sábado. Mas é online, vai, nem precisa se deslocar. É. Mas já que é online pode ser em Portugal, não pode? Pode. Quatro horas de fuso. Cinco da manhã. Todo sábado.
Se eu tivesse pensado mais um pouquinho, não teria botado pra dentro de casa dois gatos brancos, muito peludos, sabendo que só uso preto, que o sofá é azul marinho, e a almofadas, cinza chumbo. Não teria misturado esses mesmos gatinhos à minha consciência ecológica que condenam, mas condena mesmo, o descarte desnecessário de folhinhas adesivas do rolinho tira pelo.
Se tivesse pensado mais um pouquinho, não teria aberto uma lata de leite condensado, me prometendo comer só uma colherinha de chá, num domingo de escrita. Desses em que se senta na mesa da cozinha pra produzir de de manhã até à noite a exatos cinco passos da geladeira.
Se tivesse pensado mais um pouquinho, não teria me apegado a um programa sem noção que termina todo dia depois das 11h. E não teria mesmo, de jeito nenhum, entrado em um grupo de whatsapp intitulado BBB sem medo de julgamento com outros 17 psicanalistas insones e falastrões.
Se tivesse pensado mais um pouquinho, não teria aberto o horário das 7h na agenda, sabendo que, da transmissão editad,a o grupo passa pro ao vivo no streaming e que, é aí, que os comentários ficam mais ácidos, mais engraçados e mais interessantes acontecem.
Se tivesse pensado mais um pouquinho, não teria desobedecido a planilha de corrida que dizia pra descansar segunda, quarta e sexta. Não tinha sobrecarregado o joelho já sofridinho. E poderia, quem sabe, essa semana, correr terça, quinta e sábado normalmente em vez de atravessar a cidade pras dez sessões de fisioterapia.
Se tivesse pensado mais um pouquinho, não tinha levado o celular no chuveiro pra terminar de ouvir o podcast, “nesse cantinho, não há de molhar”. Não teria nem comprado esse celular esquisito que tá aqui chiando do nada. Não teria isso nem aquilo. E vocês? Se tivessem pensado mais um pouquinho?
Roberta D'Albuquerque é psicanalista, atende em seu consultório em São Paulo e escreve semanalmente no Gazeta Digital e em outros 17 jornais e revistas do Brasil, EUA e Canadá. E-mail: contato@robertadalbuquerque.com.br
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