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Opinião
Sábado - 14 de Maio de 2022 às 07:30
Por: Gonçalo Antunes de Barros Neto

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A certeza da morte angustia a todos, e ainda reforçada pela busca em dar sentido à existência. Perguntas de onde viemos - quem sou? Por que aqui estou? - e a própria existência de Deus são constantes na reflexão diária das pessoas.

Encontrar sentido para a nossa jornada neste mundo torna-se um eixo central da própria existência, pois, o que se tem é morrer sem saber o porquê viveu.

E a falta de respostas a essas indagações funciona como gatilho a desencadear mais angústia e desespero.

Contudo, para além da morte - a angústia na aceitação da morte como “possibilidade absolutamente própria, incondicional e insuperável do homem” (Heidegger, Sein und Zeit, § 53, citado por Nicola Abbagnano) -, o debruçar-se sobre o futuro causa mais apreensão, visto que “no possível tudo é possível” (Kierkegaard), ou seja, uma possibilidade favorável não tem a menor certeza de que venha a ocorrer.

Certeza da morte angustia todos e reforçada busca em dar sentido à existência

O desnudar do futuro é exercício absolutamente ineficaz. O futuro é somente uma possibilidade, que surge por escolha outra que não a do caminhante, e dentre todas as possibilidades.

Mas o conselho dos filósofos passa ao largo dos interesses imediatistas dos carreiristas, que sofrem uma existência buscando algo que na verdade é somente uma possibilidade. Trocam a vida, o momento, as especialidades que o dia proporciona, por projetos que dependem da boa vontade dos outros.

E nessa linha de acontecimentos, frustrados, os carreiristas passam a enxergar nos filhos a possibilidade de conquista daquilo que não conseguiram, e é aqui que a dor e o sofrimento só tende a aumentar, desta vez com mais vítimas.

Nesse universo criador de mais angústia, a religião vem como bálsamo a aliviar todas as dores. É o elemento de fuga que sobra como alívio medicamentoso a ser dado à alma (psique).

O sucesso religioso nesse processo de responder a esse tipo de anseio é de proporção gigantesca. Até a política, que antes se podia afirmar como ciência autônoma, princípios próprios, se vê contaminada por movimentos religiosos de várias denominações, e muitos sem dogma forte a desencadear a necessária e desejável ruptura com a relatividade das coisas.

A Igreja Católica levou séculos para se separar do Estado, muitos perderam suas vidas nessa jornada, e agora há movimentos religiosos querendo se apoderar dele. O fundamentalismo que assim age reivindica no Estado a sua verdade, o que pode trazer consequências imprevisíveis a qualquer nação democrática.

O poder corrompe e o Estado não tem a abstração do púlpito, suas ações serão sentidas a cada milímetro pelo cidadão.

Voltemos à angústia, iniciadora de uma vã cultura materialista e carreirista, próprias dos futurologistas e apropriada por movimentos religiosos.

Compreendendo bem a angústia, isso possibilitará às pessoas deixar em outro plano as necessidades, trocando-as pela virtude. A virtude da resignação com o que se é, em essência (Cuidado, isso nada tem a ver com a luta pela justiça ou mesmo pela igualdade econômica).

Magistral o ensinamento de Heidegger: a angústia “liberta o homem das possibilidades vãs e torna-o livre para as autênticas” (idem, § 68 b).

É por aí...

Gonçalo Antunes de Barros Neto é professor de Filosofia e magistrado.



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