Um elefante e um psicólogo em nossa casa Quando psicólogo vai até a casa, não atravessa somente as portas da frente
Nem sempre é possível ir até o consultório de um psicólogo ou desejável ser atendido remotamente. É o caso, por exemplo, de pessoas com doenças incapacitantes, incuráveis, progressivas ou prolongadas, como alguns cânceres, a doença pulmonar obstrutiva crônica e o Alzheimer. Ainda assim, elas podem precisar de cuidados psicológicos, já que o sofrimento devido a essas doenças não ocorre apenas fisicamente.
Nessas situações, é possível oferecer o atendimento psicológico domiciliar, por meio do qual o psicólogo poderá abordar aspectos emocionais da experiência de adoecimento do paciente ou da família.
Tristeza, ansiedade, desesperança, falta de sentido na vida, dificuldade de aderir ao tratamento médico, sensação de ter se tornado um fardo para a família, estresse e sobrecarga dos cuidadores – são várias as possibilidades de intervenção. Contudo, uma delas parece deixar as pessoas envolvidas nesses processos ainda mais desconfortáveis: o medo ou desejo de morrer.
Particularmente quando se enfrenta uma doença com prognóstico desfavorável ou que não pode mais ser curada, é normal que qualquer um se pegue pensando, temendo ou mesmo desejando a morte quando o sofrimento se torna pesado demais.
E, infelizmente, a gente passa uma vida inteira sem falar sobre a morte, até que, de repente, se vê obrigado a encará-la, a se conformar, a conviver com ela, a lidar com as próprias pendências que ela não se incomoda nem um pouco em escancarar.
Por outro lado, como quase ninguém tem muita experiência em falar sobre isso, assuntos que muitas vezes se tornam urgentes para quem está doente continuam a ser evitados ou ignorados.
Um verdadeiro elefante na sala. Além de todo o custo emocional, social e financeiro, essas questões podem agravar o sofrimento do paciente: o medo do abandono, do desconhecido e de deixar aqueles que ama.
Quando um psicólogo vai até a casa de pessoas nesse contexto, não atravessa somente as portas da frente ou dos quartos, mas também as metafóricas que é “convidado” a abrir, ou seja, os temas que outros não querem ou ainda não dão conta de discutir.
Se esse profissional dispõe de um aprofundamento na área (como a formação em Cuidados Paliativos), suas intervenções podem diferenciar fenômenos como luto antecipatório, síndrome de desmoralização e depressão, por exemplo, a fim de sugerir estratégias de cuidado.
Não é nosso papel fazer com que alguém aceite a morte ou pare de pensar ou falar sobre ela. Mas não fazer nada nesse sentido talvez seja perder uma boa oportunidade de lidar, ao mesmo tempo, com o nosso sofrimento e o de quem amamos.
Raul Tibaldi é psicólogo clínico.
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