O olhar para eles e elas Cinderela repara o que a história deixou de contar; todas devem estar representadas
Na semana que passou, uma certa senhora, atriz, postou em suas redes sociais críticas à atual versão do filme Cinderela, disponível na Amazon Prime Vídeo. O comentário repudiou o papel da fada madrinha ser personagem gay, no remake.
“A arte imita a vida”, é de Aristóteles. Todavia, Oscar Wilde, afirmou: “A vida imita a arte mais do que a arte imita a vida”. É comum ouvir que algumas coisas e situações só acontecem em filmes e novelas. Porém, é claro que as criações advêm da realidade, das vivências.
Não é à toa que a própria sociedade clama para que determinado assunto seja abordado, para que seja entendido socialmente, e deixe de ser tabu. Assuntos atuais ganham vez quando tratados no cotidiano, como deve ser. A arte oferta presentes e lições, que seres humanos racionais e eivados de emoção, podem se escorar.
E novamente necessária a lição aristotélica, quando afirma que toda racionalidade prática visa a um bem, tendo a ética o propósito de estabelecer a finalidade suprema, que se encontra acima de todas as outras. Para o filósofo, a finalidade suprema é a própria felicidade.
Não se cuida de prazeres materiais, mas, sim, de vida que demonstre e encontre prudência. Nas lições sobre ética, vislumbra-se que o ser ético vai muito além do arcaico conceito, tendo na prática do bem que redunda na felicidade, a eticidade.
A bem da verdade, a prudência em se buscar e fazer o bem, na acepção do vocábulo, não é tarefa das mais fáceis, principalmente para aqueles e aquelas que entendem que a sua individualidade está acima de qualquer pessoa. Seria democrático achar que apenas a heteronormatividade deve ser exposta em filmes infantis, se na vida cotidiana não é o que se vê?
Olhar à volta é compreender que ninguém, absolutamente ninguém, é igual ao outro ou outra. As pessoas se perfazem em infinidade de personalidades, características, axiologias, vontades, e, também, saberes. É preciso desmistificar que todo mundo deve conviver com pessoas.
E, para isso deve haver a compreensão de que qualquer pessoa pode estar em qualquer lugar. E mais, se estamos em 2.022, devemos viver o respectivo ano, as suas conquistas e entendimentos até aqui.
É premente, em tempos atuais, o conceito do que é LGBTQIAP+fobia, da qual a homofobia é usada como sinônimo. Se cuida de discriminação, aversão ou ódio individual ou coletivo, que se baseia na inferioridade dessa comunidade em relação ao conceito heteronormativo. É desprezar pessoas por entender que elas não merecem posição de respeito na sociedade.
Existem pessoas que pregam a absoluta rigidez por eles e elas imposta socialmente, sobre quem se deve amar. Sim, como se amar fizesse também parte do conceito fechado e arcaico pregado.
Não há padrão binário e cisnormativo que valham mais do que a felicidade de poder ser e externar quem é. É querer enquadrar e colocar seres humanos em caixas herméticas, como se corpos e emoções pudessem estar à disposição de travas e cadeados. O questionamento é necessário: seriam pessoas democráticas e éticas?
Estariam mesmo a pensar que independentemente de conceitos, principalmente sobre orientação sexual, alguém não teria o direito a viver e estar em sociedade?
O que o segmento LGBTQIAP+ estaria fazendo de errado para não ser aceito? Para não terem o máximo direito à representação em filmes, novelas, teatros, e por aí afora? A hipocrisia e a mentira seriam melhores?
A novel Cinderela está a reparar o que a história deixou de contar. Pessoas, todas elas, devem estar representadas em todos os lugares. Johnny Hooker, na canção “Flutua”, disparou: “Um novo tempo há de vencer/ Para que a gente possa florescer/ (...) amar sem temer/ (...) Ninguém vai poder querer nos dizer como amar.”
Rosana Leite Antunes de Barros é defensora pública estadual.
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