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Opinião
Domingo - 30 de Outubro de 2022 às 09:01
Por: Gonçalo Antunes de Barros Neto

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Vive-se sob novos paradigmas num mundo líquido (Bauman, em substituição à ideia de pós-modernidade), que nem sempre são facilmente identificáveis.

O indivíduo, de sujeição individual no mundo jurídico e político, passou a ser um componente de sua própria identidade. Está contido, não é mais continente, conteúdo.

Para se estudar e individualizar alguém, nesse complexo processo de qualificação, precisa-se estar munido de dados que até então passavam ao largo de sua existência como membro comunitário. Sua imagem refletida transmuda-se em representação do que verdadeiramente é. Explica-se.

Hoje, o que se é nas redes sociais não é exatamente aquilo que se pensa ser. Nesse novo mundo virtual se pode assumir várias identidades e trocá-las conforme as circunstâncias.

Afinal, quantos “login” podem fabricar, com os mais variados apelidos e características pessoais? Pode-se “logar” como Batman ou Capitão América e dar a esses personagens características outras conforme o alcance da imaginação do criador. O assumir identidades está se tornando febre e passatempo predileto de muitos.

Noutro norte, a economia e a política te analisam conforme o círculo potencialmente identificador de suas predileções, compras, trabalho, religião, renda, etc.

Você não é o que pensa e o que realiza, mas a vontade do grupo a que pertence. A clássica definição de cidadão, e de cidadania, está ultrapassada.

Ao indicar seu sobrenome, estará irremediavelmente indicando pertencer a um determinado segmento. Da mesma forma, seu trabalho, sua religião e outras mais. Isso tudo leva ao fim da heterogeneidade enquanto indivíduo e indistinto de direitos, para algo muito mais aberto - grupos. Tal estado de coisas gera divisão por castas, classes de pessoas de características comuns.

Das pessoas não se pode mais afirmar serem livres, ainda que se considere a relatividade conceitual da liberdade. Estão irremediavelmente acopladas a sentimento de pertencimento.

Cada qual carrega sua identidade no perfil de abordagem já de antemão estudado. Maria não é Maria e João não é João, mas pertencentes a um intrincado referencial de iguais, formado por teorias das mais variadas roupagens empíricas.

Isso é mais devastador quando se trata do sistema jurídico. No Direito as coisas se complicam ainda mais. Logo, logo, se ponderará princípios constitucionais segundo as origens. Seria uma espécie de dignidade humana ou mesmo direito de ir e vir circunstanciais, relativizados pelas variáveis grupais. Guantánamo parece exemplificar.

Passou-se o século XX lutando pelas conquistas individuais e coletivas; contudo, dessas, somente o coletivo pragmático e útil se está vingando, sobrevivendo. O governo reconhece seu cidadão por um número (RG ou CPF) e logo o conecta a um determinado perfil de contribuinte, ou de roupagem política determinada.

A divergência no Parlamento deixou de ter conteúdo específico para virar ponto-de-vista do governo ou da oposição, da maioria ou da minoria, e assim sucessivamente. Conceitos como certo e errado, justo e injusto, legal e ilegal, foram substituídos por referenciais contra ou a favor de um movimento de ideia, que ninguém sabe ao certo sobre sua densidade orgânica e sutileza de propósito.

Tudo isso faz lembrar de Lulu Santos, em “Assim caminha a humanidade: Com passos de formiga/E sem vontade/Não vou dizer que foi ruim/Também não foi tão bom assim/Não imagine que te quero mal/Apenas não te quero mais/Não te quero mais” ... “Nunca mais!”.

É por aí...

Gonçalo Antunes de Barros Neto tem formação em Filosofia e Direito.



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