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Opinião
Quarta - 30 de Novembro de 2022 às 06:58
Por: Rosana Leite Antunes de Barros

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Exercer a profissão do direito perante o sistema de justiça, pelo ‘ser mulher’, é desafiador. Local de predomínio do gênero masculino, onde histórias, aos montes, são narradas a mostrar os desrespeitos sentidos pelas mulheres.

Dias atrás, uma advogada passou por situação constrangedora. Tendo atuado perante o Tribunal do Júri na ocasião, ao final da sessão de julgamento, a mulher ouviu do promotor de justiça que teria “rebolado” para convencer os jurados.

No Brasil, é o Tribunal do Júri o competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, aqueles onde existe a intenção em matar. Matar, ou tentar contra a vida de alguém, é de tamanha gravidade, que, constitucionalmente, foi deixada para um Conselho de Sentença, formado pelo juiz presidente e mais 07 (sete) jurados ou juradas no dia do julgamento, a apreciação e julgamento do fato.

Conhecidos como “juízes ou juízas” da causa, eles e elas decidirão pela condenação ou absolvição do réu ou da ré. A bem da verdade, os júris no país se constituem em retirada das mãos de uma pessoa somente tamanho poder em condenar ou absolver alguém acusado ou acusada de cometer esse tipo de delito.


Se em outros tipos de ações que tramitam perante o Poder Judiciário, o julgador ou julgadora poderá aquilatar sobre determinado fato exarando a sua decisão, nos júris esse poder ultrapassa o entendimento de pessoa única. A sociedade representada, composta por sete pessoas, decidirá sobre aquele corpo de acordo com os mandamentos da consciência, em caráter de serviço público obrigatório.

De outro lado, ninguém pode ser processado e julgado sem a respectiva defesa. E segundo a Constituição Federal, a plenitude da defesa é princípio específico. Os resultados dos julgamentos hão de ser respeitados, em regra, por serem soberanos, de forma que os recursos acontecerão apenas se for a decisão contrária à prova dos autos.

Voltando à dita fala, onde o órgão de acusação afirmou que estaria a advogada da causa a usar o respectivo “rebolado”, além da vítima direta, ferida ficou a sociedade, representada pelos julgadores e julgadoras.

O fato narrado externou a sanha em se “ganhar”, desconsiderando a soberania dos vereditos, e, ainda, em se buscar o resultado justo das decisões. As discussões através dos debates, pelo jeito, ultrapassaram o bom senso, fazendo com que o ataque pudesse substituir a legislação.

Infelizmente, na ocasião, as mulheres foram insultadas, porquanto, afirmar que uma mulher tem o “hábito de rebolar”, com a finalidade de ganhar determinada causa, é o mesmo que ditar que elas se utilizam de sedução para mudar decisões e contextos. Não é de hoje que mulheres “ofendem” por atuarem em locais onde a oratória e o intelecto fazem as vezes. Não contente, o profissional do direito ainda questiona a mulher se havia acabado com o respectivo teatro.

O episódio se constitui em um daqueles fatos inesquecíveis juridicamente, onde se “ganhar”, ainda que tenha que ofender, se perfaz em mais importante do que a garantia da verdade.

A cordialidade e a urbanidade passaram longe da expectativa esperada em julgamentos. O dia 29 de novembro é dedicado para refletir sobre as defensoras dos direitos humanos, sendo essa uma das vertentes a se pensar, se concretizando em violência de gênero.

O fato foi externado em época da campanha internacional pelo enfrentamento à violência contra as mulheres. Se no lugar da advogada estivesse um profissional do gênero masculino, a agressão aconteceria?

Rosana Leite Antunes de Barros é defensora pública estadual.



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