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Opinião
Sábado - 04 de Março de 2023 às 07:24
Por: Renato Gomes Nery

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Olho para as coisas ao meu redor e vejo tantas delas que perderam a utilidade. Uma máquina de escrever antiga. Um furador de papel. A minha biblioteca profissional com milhares de volumes que eu comprei, a duras, e que não utilizo ou o faço raramente.

Estas pastas com os arquivos de papéis antigos e remotos que pedem para liquidá-los. Sem falar em tantas coisas que possuo sem mais serventia. Enfim, um mundo que se foi numa rapidez espantosa. É a minha história! Devo jogar fora tudo isto e liquidá-la completamente?

Acho que as pessoas vão se desfazendo ao longo do tempo, juntamente com tudo que elas foram. Este processo faz parte desta vida efémera, cujos rastros se apagarão com o tempo, pois tudo se transformará, como preceitua a Lei de Lavoisier, e nada sobreviverá a inefável eternidade.

Comecei este artigo pensando em escrever sobre outra coisa, mas fui traído pela minha memória, com a reflexão acima, cuja conclusão e o desfecho eu não encontro. Não me parece ser delírio, pois este é um dos sintomas de esquizofrenia, mas não creio que me enquadro neste figurino.


Devem ser desejos vãos, incontidos e inconclusos. Deixo, entretanto, este mister para a fadista Mariza, na música Desejos Vãos:

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“ Eu queria ser o mar de altivo porte
Que ri e canta, a vestidão imensa!
Eu queria ser a Pedra que não pensa,
A pedra do caminho, rude e forte!

Eu queria ser o Sol, a luz intensa,
O bem do que é humilde e não tem sorte!
Eu queria ser a árvore tosca e densa
Que ri do mundo vão e até da morte!

Mas o Mar também chora de tristeza...
As árvores também, como quem reza,
Abrem, aos Céus, os braços, como um crente!

E o Sol altivo e forte, ao fim de um dia,
Tem lágrimas de sangue na agonia!
E as Pedras...essas...pisa-as toda gente!...”

A você que é cartesiano e se pauta pela estrita lógica, muitas coisas e atitudes carecem deste predicado. E, certamente, não vai encontrá-la, aqui, neste Brasil ilógico, pois, com esta virtude, o Criador, não o dotou e nem aos que nele o habitam.

Existe um desejo atávico, originário dos indígenas, que acreditavam que viria um Deus para resgatá-los. Transvertido, apareceu o colonizador, que não deixou pedra sobre pedra, mas a sequela permanece. Acredita-se ainda, por aqui, em “boi tatá”, “fogo fátuo” e tantas outras quimeras e, por que não dizer, em caudilhos, encantadores de serpentes e em salvadores da pátria que nos darão o paraíso por decreto. Triste fado!... Que jamais pode ser mudado...

Tributo estes devaneios a COVID e, aos tantos anos que tenho e deixaram a minha memória afetada. Isto me queda constrangido para com as pessoas com quem parlo e com você meu caro leitor que tem a paciência de me lê regulamente. Afirma, a minha médica, que este sintoma, creditado a pandemia, é passageiro e que eu resgatarei plenamente a memória. Espero que ela esteja com a razão.

Portanto, meu caro leitor, não cobre tanto deste filho de retirantes, nascido neste torrão, pois ele corre apressado das contradições, das incoerências e das amarras para jogar alguma luz na severa escuridão que nos cerca.

Renato Gomes Nery é advogado.



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