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Opinião
Terça - 26 de Março de 2024 às 00:16
Por: Luiz Henrique Lima

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Quando, Maria Cândida e eu, construímos nossa casa em Cuiabá, plantamos um jardim e mais de setenta árvores, de múltiplas espécies. Com o tempo, as sementes e mudas cresceram e ganharam vida própria.

Caminhar pelo jardim e contemplar a natureza pode nos inspirar reflexões as mais diversas. Poetas ali encontrarão temas para seus versos. Quanto a mim, simples observador, recolho lições para a vida.

Compartilho aqui algumas dessas anotações, quiçá úteis, para jardineiros amadores, para gestores profissionais ou para leitores ocasionais.

Sem água as plantas não vivem. Água em demasia as fragiliza. De igual modo, o sol.


Se o jardim não atrai abelhas, beija-flores, outros passarinhos, minhocas e variados insetos, algo está errado.

Podar as plantas regularmente orienta e impulsiona o seu crescimento.

Todos os dias o jardim está diferente. Plantas nascem, outras morrem. Caem folhas, surgem flores, brotam frutos.

Galhos mortos devem ser removidos. Embora não consumam mais a seiva vital, seu peso sobrecarrega a árvore e compromete o seu desenvolvimento.

Cuidado ao remover os galhos mortos. Os espinhos permanecem afiados e ferem da mesma forma.

O mato cresce, mesmo nos mais belos canteiros de flores.

Cuidado ao cortar o mato, para não arrancar junto a planta que ele escondia.

Há plantas que surgem não se sabe como. Outras que morrem não se sabe o porquê. Há as que geram frutos regularmente, como o limoeiro e a laranjeira, e há as inconstantes, como a amoreira e o butiazeiro, e há algumas estéreis como o pé de lichía.

Há plantas que abraçam as outras, há as que se protegem mutuamente e há aquelas que sufocam as vizinhas, subtraindo-lhes o sol e a água.

Nosso pé de jambo morreu com a fumaça dos incêndios de 2020 no Pantanal, a goiabeira pela imperícia de um pedreiro e um dos coqueiros porque o solo tinha piçarras.

Por outro lado, o cajueiro é glorioso na sua copa e os ipês se erguem altaneiros acima de tudo e de todos. O pé de acerola é o mais produtivo e as primaveras são as mais floridas. O aroma do jasmim é dominante e a delicadeza das rosas encantadora.

No seu conjunto, o jardim é complexo, é caótico, é belo, é trabalhoso e é compensador. Como a vida.

Por vezes, ao amanhecer, quando faço a minha oração, a visão do jardim me recorda a parábola do semeador, presente no evangelho de Mateus, e que comparo com a minha atuação como professor e escritor. Cada um de nós, na sua caminhada, semeia aquilo que traz dentro de si. Porém, se as sementes são as mesmas, conforme quem as recebe, os resultados são os mais diversos.

Como ensinou o imortal Voltaire, na derradeira frase de sua obra ‘Candide ou l’optimisme’, é preciso cultivar nosso jardim.

Luiz Henrique Lima é professor e escritor.



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