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Opinião
Segunda - 30 de Maio de 2011 às 07:48
Por: Licínio Carpinelli Stefani

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Não aprecio a intromissão nos assuntos brasileiros como os concernentes aos presídios brasileiros. Países que não dão exemplo algum como os EUA e outros, através de órgãos internacionais, por aqui se imiscuem, falando de direitos humanos, apresentando censuras, medidas, projetos, os quais eles mesmos não seguem. Não há necessidade de referência, pois no período Bush, a tortura face os interesses do grande país foi tolerada e sobre ela se fez vista grossa. Mas não podemos fechar os olhos à terrível realidade dos presídios brasileiros. Em expressivo artigo denominado “Condições desumanas e superlotação: o caos do sistema penitenciário brasileiro”, César L. Cruz e Sérgio T. Amaral citam e descrevem o caos de dois presídios do Espírito Santo, o de Vila Velha e o da Serra. O relato fere a sensibilidade do leitor. Em celas onde poderiam conviver apenas 35 presos estavam custodiados 300, todos para um único banheiro.

 
O acúmulo fazia todos permanecerem de pé, não havendo possibilidade de pernoite de todos ao mesmo tempo. Muitos defecavam nas embalagens da comida, dada a impossibilidade do uso simultâneo do banheiro, e armavam redes, um acima do outro, para poderem descansar e dormir. Não havia janelas e não se recebia o sol e para a ventilação havia um único ventilador situado no corredor. A medicação praticamente não existia e nem havia separação dos presos considerando-se sua periculosidade, grau de condenação ou fase de julgamento. Outros eram detidos em contêineres cuja temperatura chegava a 35º C, nos quais havia 1 banheiro para 20 homens, sem esgoto ou coleta de lixo e tudo rodeado de ratos. Esse tipo de prisão só foi desativado no ano de 2009 depois de tantas denúncias.
 
Se esse quadro é horripilante, a verdade é que o sistema prisional brasileiro está totalmente falido. Não se tem com precisão estatísticas, mas se sabe que temos atualmente, segundo o Departamento Nacional Penitenciário (Depen), cerca de 446 mil integrantes do sistema penitenciário nacional dos quais 40% dos presos aguardam julgamento. Ainda se considerarmos uma década transcorrida, teríamos, um déficit na capacidade de custódia de 27% e também, próximo de 300 mil mandados não cumpridos por falta de presídios. Ressalve-se ser a comida fornecida, via de regra, de baixa qualidade, descurando das condições mínimas de higiene. Como também não se dá condições alguma para o asseio do custodiado, proliferando as doenças e suas transmissões.
 
Nessa balbúrdia a Aids e as doenças venéreas proliferam. Trabalho via de regra não é exigido e assim tudo isso leva a um quadro de descontrole total na segurança, motivando as seguidas rebeliões. Não há recuperação do custodiado e dá-se condições a um aperfeiçoamento passando as prisões a se constituírem em ‘Universidade do Crime‘. Certamente algumas medidas excelentes foram introduzidas e entre elas, se distingue, a adoção das penas alternativas, o que compele a separação do infrator e possibilita a punição sem custodia. Mas, espera-se, que para tudo não se peça a custodia, como se ela fosse a solução para tudo, como, de igual forma, não se possa consagrar a impunidade desculpada sob a alegação da falta de casa de custodia.
 
O assunto é delicado, mas, acima de tudo, o legislador deve entender, que se o presidiário não garante voto, ele tem porém direitos humanos os quais devem ser preservados e ainda o cidadão comum também os tem, especialmente, o de ser separado, protegido, preservado do convívio daquele que ameaça, por sua conduta infracional, sua segurança. Assim é indispensável se repensar sobre o falido sistema prisional brasileiro e nele se investir com os recursos indispensáveis, medidas alternativas, criando prisões de natureza rural e outras, nas quais se possibilite o trabalho fonte primorosa de recuperação, se possibilite o ensino incluso religioso, habilitações ao menos praticas a fim de que o custodiado possa sair em condições de procurar trabalho e se adequar no sistema social. Se isso não fizermos estaremos criando um quadro incontrolável prestes a explodir como recentemente sucedeu em São Paulo com a rebelião direcionada pelo PCC envolvendo 29 presídios. Vamos refletir e agir!

Licinio Carpinelli Stefani é desembargador aposentado. E-mail: liciniocarpinelli@cfadvocacia.com.br



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