Rio Cuiabá: Um elemento de paisagem Ele foi roteiro de aventuras esplendorosas e epopeias trágicas e grandiosas
Nas várias versões da história da Vila Real do Bom Jesus de Cuiabá e da cidade de Cuiabá, o rio homônimo foi roteiro de aventuras esplendorosas, de epopéias trágicas e grandiosas, de práticas cotidianas quase invisíveis a viajantes e desbravadores. É um elemento principal de paisagem, representa vida para a cidade.
Vivemos em contato com ele, vivemos dele, somos íntimos dele. A nossa culinária está ligada a ele. O nosso linguajar está ligado nele.
O nosso peixe advém dele. As hortas estão em seu entorno, a cerâmica, as redes, a cana e a rapadura, cuja cidade Karl von den Steinen assim descreveu o seu olhar sobre a cidade de Cuiabá: ...uma linda cidade balneária alemã, numa tarde de domingo, quando toca a banda militar. Imaginou encontrar-se num vilarejo da Turíngia ao constatar "a liberdade patriarcal do bom gado", ao verificar a sem cerimônia com que porcos cabritos e, outros animais andavam pelas ruas.
No Cuiabá, a rede de rios e seus afluentes que cortam o Estado de Mato Grosso, em todas as direções é grande, oferecendo recursos hídricos dos mais caudalosos. Dentre as bacias que cortam este território, as três principais são: Bacia Amazônica, ao norte, cujos rios vão desaguar no maior rio do mundo, em volume: o Amazonas; Bacia do Paraguai, a oeste, tendendo para o sul; Bacia do Paraná, a sudeste, também tendendo para o sul, encontrando-se fora do Estado com a do Paraguai.
Foi e é reservatório de inspiração para a construção cotidiana das culturas ribeirinha e urbana. Nele, as artes, a música, a literatura, a poesia, as festas, as danças têm perene fonte de inspiração.
Festas e danças como siriri, cururu, São Gonçalo, as lavações de São João, a festa de São Pedro, padroeiro dos pescadores, a honra a São Benedito e ao Senhor Divino para os cuiabanos não são tradições, são vivências.
Comer peixe, principalmente os mais nobres como o pacu assado, a moqueca feita do pintado com a mandioca, a pacupeva cozida acompanhada do arroz sem sal, o bagre ensopado e a piraputanga recheada com farofa de banana da terra, não são pratos típicos da culinária cuiabana, são pratos do dia-a-dia, oriundos das famílias ribeirinhas. São comidas que invadiram os lares cuiabanos e se tornaram costumes e culinárias tradicional, regional e nacional.
Cultuar os santos como Nossa Senhora, Santa Rita, São Benedito, Senhor Divino, São Pedro, São Gonçalo, São João, festejá-los, lavá-los hoje, nas águas do rio Cuiabá ou, como outrora, em suas fontes, poços, chafarizes e bicas não são folclores, mas costumes que marcam as relações profundas dos córregos, rios, das suas águas com os moradores, num encontro de vida com as suas águas doces potáveis sagradas e profanas.
Precisamos cuidar das nossa águas. Precisamos cuidar do Rio Cuiabá, seu principal elemento de paisagem e de vida. Viva Cuiabá!
Neila Barreto é jornalista, historiadora e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso.
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