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Um Discurso, Repercussão Apagada
Tudo foi cuidadosamente organizado. O cenário favorecia e o momento também. Pois a inflação – o indomável dragão das décadas anteriores a 1993 – ameaça reagir, depois de quase vinte anos de sono profundo. Ocasião propícia para o ressurgimento da oposição, presa até agora a sua própria taciturnidade e anemia. Estrategicamente, o plano era perfeito, uma vez que o ambiente lhe era muito favorável. Até o plenário foi decorado para a ocasião, com uma assistência invejável e visitas ilustres, a exemplo do ex-governador José Serra. O tucano-porta-voz para tal empreitada teve tempo para o ensaio, e o discurso estava na ponta da língua. Porém, ninguém imaginou que o imprevisto pudesse conspirar contrariamente.
Imprevisto em forma de crueldade, de loucura e de mortes de crianças em uma escola no Rio de Janeiro. Pegou a todos de surpresa, e norteou as conversas, desde as dos botequins, ou as das redes sociais até as dos programas televisivos, radiofônicos e dos blogs. Não se ouviu outra coisa senão o dito massacre, e não sem razão, pois o episódio mexeu com cada pessoa, brasileira ou não, residente ou fora da “Cidade Maravilhosa”.
Nada, ou quase nada, entretanto, do discurso do senador tucano e mineiro. A mídia estava ocupada, a população hipnotizada diante do ocorrido, e os analistas políticos falaram no vazio. Ainda que as palavras do ex-governador mineiro e senador tenham direção e foco. Elas, as palavras, foram fortes, certeiras, firmes, sem serem “agressivas”, e saíram a favor do respeito e do “direito à defesa e ao contraditório”, o que não se pode confundir – alertava – “com complacência ou compadrio”.
O plenário emudecia. Instante em que o orador, seguro, convidava a trincheira os parlamentares que reconhecem ter apenas o povo como senhor e a própria consciência como única senhora. Novamente o silêncio, enquanto da tribuna o tucano afirmava: O Brasil de hoje é resultado de uma vigorosa construção coletiva que, desde os primeiros sopros da nacionalidade, vem ganhando dimensão, substância e densidade. Ao contrário do que alguns nos querem fazer crer, o País não nasceu ontem”.
A oposição se regozijava, e, sem perder tempo, o tucano lembrava: “Juntos, nós, brasileiros, percorremos os caminhos que nos trouxeram até aqui”. “Mas é importante e justo que nos lembremos, sempre, que não chegamos até aqui percorrendo os mesmos caminhos”. Notava-se certo desconforto dos situacionistas, que se valeram do aparte. Mas as frases ditas pelo tucano lhes soavam como xeque-mate, bem como o sentido de relembrança e de confirmação do presente, pois “sempre que precisou escolher entre os interesses do Brasil e a conveniência do partido, o PT escolheu o PT”. Antes que alguém reagisse contrário, o neto de Tancredo Neves vinha com nova bordoada: “Por isso, não é estranho (...) que setores do partido tentem, agora, convencer a todos de que os seus interesses são, na verdade, os interesses da nação. Nem sempre são”.
As frases se encaixavam uma a uma. “Contra os fatos, não havia argumentos”, diria uma pessoa da galeria. Em êxtase, e em meio ao sorriso de descontração dos membros do DEM e do PPS, o tucano voltava à carga, desta feita para reconhecer as virtudes do governo Lula, entre as quais “a manutenção dos fundamentos da política econômica implantada pelos governos anteriores”. Seria esta, no seu entender, “o primeiro e o mais importante mérito da administração petista”. Para completar, logo em seguida, que “por mais que desagrade a alguns, a independência dos historiadores considerará os governos Itamar, Fernando Henrique e Lula um só período da história do Brasil, de estabilidade com crescimento, sem rupturas”.
O tom empregado era duro, mas não agressivo ou de revanche. Tinha, portanto, o sentido de arregimentar os oposicionistas, até aquele momento igual a uma manada desenfreada. Foi o melhor dos discursos proferidos no Senado, no Congresso, nos últimos nove anos. Contudo, de repercussão mínima, apagado pela notícia do massacre. De nada, portanto, valeram os ensaios e as estratégias, e belas palavras, que desenhavam grande parte de uma verdade até o momento escamoteada pelo véu da popularidade do presidente que se foi.
Lourembergue Alves é professor universitário e articulista de A Gazeta, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos.
Imprevisto em forma de crueldade, de loucura e de mortes de crianças em uma escola no Rio de Janeiro. Pegou a todos de surpresa, e norteou as conversas, desde as dos botequins, ou as das redes sociais até as dos programas televisivos, radiofônicos e dos blogs. Não se ouviu outra coisa senão o dito massacre, e não sem razão, pois o episódio mexeu com cada pessoa, brasileira ou não, residente ou fora da “Cidade Maravilhosa”.
Nada, ou quase nada, entretanto, do discurso do senador tucano e mineiro. A mídia estava ocupada, a população hipnotizada diante do ocorrido, e os analistas políticos falaram no vazio. Ainda que as palavras do ex-governador mineiro e senador tenham direção e foco. Elas, as palavras, foram fortes, certeiras, firmes, sem serem “agressivas”, e saíram a favor do respeito e do “direito à defesa e ao contraditório”, o que não se pode confundir – alertava – “com complacência ou compadrio”.
O plenário emudecia. Instante em que o orador, seguro, convidava a trincheira os parlamentares que reconhecem ter apenas o povo como senhor e a própria consciência como única senhora. Novamente o silêncio, enquanto da tribuna o tucano afirmava: O Brasil de hoje é resultado de uma vigorosa construção coletiva que, desde os primeiros sopros da nacionalidade, vem ganhando dimensão, substância e densidade. Ao contrário do que alguns nos querem fazer crer, o País não nasceu ontem”.
A oposição se regozijava, e, sem perder tempo, o tucano lembrava: “Juntos, nós, brasileiros, percorremos os caminhos que nos trouxeram até aqui”. “Mas é importante e justo que nos lembremos, sempre, que não chegamos até aqui percorrendo os mesmos caminhos”. Notava-se certo desconforto dos situacionistas, que se valeram do aparte. Mas as frases ditas pelo tucano lhes soavam como xeque-mate, bem como o sentido de relembrança e de confirmação do presente, pois “sempre que precisou escolher entre os interesses do Brasil e a conveniência do partido, o PT escolheu o PT”. Antes que alguém reagisse contrário, o neto de Tancredo Neves vinha com nova bordoada: “Por isso, não é estranho (...) que setores do partido tentem, agora, convencer a todos de que os seus interesses são, na verdade, os interesses da nação. Nem sempre são”.
As frases se encaixavam uma a uma. “Contra os fatos, não havia argumentos”, diria uma pessoa da galeria. Em êxtase, e em meio ao sorriso de descontração dos membros do DEM e do PPS, o tucano voltava à carga, desta feita para reconhecer as virtudes do governo Lula, entre as quais “a manutenção dos fundamentos da política econômica implantada pelos governos anteriores”. Seria esta, no seu entender, “o primeiro e o mais importante mérito da administração petista”. Para completar, logo em seguida, que “por mais que desagrade a alguns, a independência dos historiadores considerará os governos Itamar, Fernando Henrique e Lula um só período da história do Brasil, de estabilidade com crescimento, sem rupturas”.
O tom empregado era duro, mas não agressivo ou de revanche. Tinha, portanto, o sentido de arregimentar os oposicionistas, até aquele momento igual a uma manada desenfreada. Foi o melhor dos discursos proferidos no Senado, no Congresso, nos últimos nove anos. Contudo, de repercussão mínima, apagado pela notícia do massacre. De nada, portanto, valeram os ensaios e as estratégias, e belas palavras, que desenhavam grande parte de uma verdade até o momento escamoteada pelo véu da popularidade do presidente que se foi.
Lourembergue Alves é professor universitário e articulista de A Gazeta, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos.
Fonte:
Lourembergue Alves
URL Fonte: https://reporternews.com.br/artigo/691/visualizar/
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