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Opinião
Sábado - 19 de Fevereiro de 2011 às 17:38
Por: Lourembergue Alves

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Em um canto da sala de aula, Silva estava pensativo. Percebera que nada sabia a respeito de contas. Embaraçava quando topava com números a sua frente. Talvez por isso, sempre cometia erros. Ainda que fosse uma simples subtração. Mas alguma coisa lhe dizia que “R$ 545,00 era menor que R$ 600,00”. Seus colegas, no entanto, o convenceram do contrário. Titubeou-se por alguns instantes. Mas, logo, “deu o braço a torcer”. Afinal, até a professora Dilma – lá do alto de sua sapiência e com seu jeito todo professoral – estava do lado deles. “Ou eram seus colegas que se encontravam lado a lado com ela?” Novamente viu a si próprio em dúvidas. Por isso continuou ali, recluso no seu lugarzinho, distante dos demais. 

Nesse ínterim, via televisão, especialistas davam suas explicações sobre inflação, orçamento e contas das prefeituras e da previdência social. Coisas que nunca “entravam no entendimento” do Silva. Por mais que essa gente falava, e os políticos apresentavam suas considerações, as quais serviam de uma espécie de satisfação o porquê se posicionavam favoráveis ao governo, o Silva continuava sem entender. Até porque, na sua cabeça, o que diziam nada tinha a ver com as lamúrias do pai, cujo salário mal dá para acompanhar a alta dos preços da comida, dos remédios e das roupas. 

Desentendimento que se amplia quando soube do reajuste salarial de 62% para os parlamentares. Os mesmos que, na sua maioria, não “pensaram duas vezes” em impedirem maior índice percentual para o salário mínimo.

Salário que, por ser mínimo, deixou impotente o seu pai diante da enfermidade da mãe. As portas foram uma a uma fechadas. Restou-lhe ficar com o Pronto Socorro. “Dava dó, ver a mãe no corredor daquela Casa de Saúde – desconfortável e desatendida”! A morte, portanto, veio a lhe oferecer a paz.

Órfão de mãe, Silva se reservou cada vez mais. Passava horas e horas recolhido em si mesmo, preso no seu “mundinho”. Sequer era notado na sala de aula. Nem pela professora, cujo olhar se dirigia quase sempre a um grupo de alunos, filhos de “gente grã-fina do lugar”. Tinha até o Luizinho – afilhado do deputado federal – que, volta e meia se encontrava por ali, prometendo mais emendas. “Parecendo até que esta é a única responsabilidade de um parlamentar”, esbravejava “Seu Inácio” – pai do Silva. Tanto que, durante todo tempo de campanha, falava “do dinheiro que havia liberado para o município”. O que levou um “montão de pessoas a votar nele”. “Quase como a uma obrigação”, saia murmurando.
 
Silva, portanto, tinha uma visão enviesada do que seria o trabalho de um integrante do Congresso Nacional. Em boa hora, então, a presidente do país resolveu se responsabilizar do reajuste do salário mínimo, sem que tal reajuste passe pelo crivo dos congressistas, a partir do ano vindouro. Pois jamais entenderia da aritmética utilizada, e isso o levou a se embaralhar, a ponto de se perder entre R$ 545,00 e R$ 600,00. Ficou com os R$ 600,00 a moda Tiririca, mesmo sem saber qual desses valores é o maior.       

     
Lourembergue Alves é professor universitário e articulista de A Gazeta, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos. E-mail: Lou.alves@uol.com.br.  


Autor

Lourembergue Alves

LOUREMBERGUE ALVES é professor universitário e articulista

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