Desafio para estadistas
A indústria foi uma das responsáveis pela rápida recuperação do Brasil, um dos primeiros países a vencer a grande crise mundial de 2008 e 2009. Contudo, o setor é o mais exposto às danosas consequências da sobrevalorização do Real, que está exacerbando as desvantagens competitivas de nossos produtos, abrindo espaço a volumes crescentes de importações, em detrimento da produção nacional.
O bom desempenho da manufatura em 2010 e os riscos que pesam sobre ela no ano novo são temas preocupantes. Diante da importância do assunto, não só para a própria atividade, como para a nossa economia, é necessária uma profunda reflexão sobre os fatores que permeiam a questão cambial.
Embora seja essa uma ameaça aguda, exigindo solução urgente, trata-se apenas de um dos fatores que dificultam a concorrência das mercadorias brasileiras no comércio internacional. Sua premência, portanto, não pode relegar a um segundo plano as reformas estruturais (em especial a tributária/fiscal/previdenciária e trabalhista), há tanto tempo reclamadas pela sociedade.
Com redução de impostos e, simultaneamente, dos gastos de custeio do governo e desoneração dos encargos incidentes sobre a folha de pagamentos, sobrarão mais recursos para investimentos privados e públicos e será possível reduzir os juros (e taxas menores também significam menos atração de moeda estrangeira em busca de remuneração em nosso mercado financeiro, mitigando a tendência de alta do Real).
Nessa análise delineia-se, portanto, o grande desafio da presidenta Dilma Rousseff. Caso ela consiga efetivar as reformas, terá dado imenso passo para a sustentabilidade da boa performance da economia brasileira. Esperamos, dessa maneira, que a nova equipe de governo atente para o alerta dos setores produtivos quanto à impossibilidade de nosso PIB continuar crescendo em ritmo adequado num cenário de juros e impostos exagerados e câmbio equivocado.
Nesse contexto, são muito preocupantes os rumores quanto a uma eventual tentativa de recriação da CMPF, aquele famigerado imposto do cheque, que combatemos com tanto vigor em 2007, impedindo que continuasse tirando montanhas de dinheiro das atividades produtivas. Afinal, a arrecadação tributária do governo está quebrando todos os recordes e as verbas do orçamento para a saúde (setor ao qual deveria destinar-se a taxa) sequer têm sido integralmente gastas.
Assim, em vez de se falar em aumentar impostos e ressurreição de tributos, seria fundamental que a presidente da República e a nova Legislatura priorizassem as reformas estruturais. Esta é a lição de casa essencial para garantir o crescimento perene e o almejado desenvolvimento! Nosso sistema tributário precisa ser indutor e não um freio aos investimentos e à geração de empregos; o Estado não deve arrecadar mais do que precisa para manter serviços de qualidade em saúde, educação, segurança pública e seguridade social, bem como para arcar com investimentos em infraestrutura e custeio parcimonioso de sua máquina administrativa.
Se atender a esse antigo anseio dos brasileiros, Dilma Rousseff não será simplesmente presidente da República. De seu futuro currículo certamente constará a palavra "estadista".
Paulo Skaf, 56 anos, é empresário e presidente da Federação e do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp)
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