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Opinião
Terça - 26 de Setembro de 2023 às 04:04
Por: Luiz Henrique Lima

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No direito ambiental, um dos institutos mais consagrados é o princípio poluidor-pagador - PPP.

Referido princípio foi inicialmente introduzido pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômicos - OCDE em 1972 e preconiza que “o poluidor deve suportar a totalidade dos custos de prevenção e de luta contra a poluição”. Posteriormente, foi incorporado à Agenda 21 das Nações Unidas, à Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (princípio 16) e à Constituição brasileira.

Na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/1981, art. 4º, VII) isso se traduziu na imposição ao poluidor da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados. De igual modo, outras normas acolheram o PPP.

O princípio poluidor-pagador significa que os custos de recuperação do meio ambiente afetado devem ser atribuídos ao poluidor. Assim, os preços devem compreender os custos com a prevenção dos danos ambientais.


Cumpre esclarecer que não se trata de admitir a atividade poluidora mediante pagamento, mas de cobrar-se das atividades que poluem de alguma forma o meio ambiente, inclusive quando nos limites e padrões da legislação ambiental. Assim, o objetivo é estabelecer um mecanismo econômico que desestimule a degradação ambiental.

De um modo geral, o PPP pode ser aplicado por meio de taxas ou tarifas pela emissão de efluentes, de taxas sobre os produtos poluentes, de sistemas de consignação, da criação de mercados de direito de poluição etc. Entretanto, na maioria dos países, ele é aplicado por meio de regulamentações diretas, na medida em que essas transferem para o poluidor os custos ligados ao respeito às normas ambientais.

Porém, nem sempre os legisladores e formuladores de políticas públicas acertam. Ao contrário, sucede de praticarem erros clamorosos que provocam confusão, contradição e efeitos contrários ao que seria desejável.

Um exemplo são os critérios de repartição dos recursos arrecadados com a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível - CIDE-combustíveis (Leis 10.336/2001 e 10.866/2004). De acordo, com os padrões vigentes, quanto mais “suja” for a matriz energética de determinado estado ou município, maior será a proporção de recursos que receberá da União.

Por exemplo, se um estado ou município tiver na sua matriz de consumo de combustíveis uma elevada participação de gás natural veicular ou de veículos elétricos receberá bem menos recursos do que se o seu consumo fosse integralmente de combustíveis fósseis. Da mesma forma, incentivos bem-sucedidos à utilização de bicicletas, ao transporte solidário e ao transporte público podem provocar perdas de arrecadação para o ente federativo. O que é positivo sob o aspecto ambiental torna-se negativo sob o aspecto fiscal.

Há, nesse caso, um incentivo econômico à “carbonização” ou, pelo menos, um desestímulo à adoção de matrizes energéticas de menor impacto ambiental. O mais paradoxal é que o tributo se destina, entre outros, ao financiamento de programas de infraestrutura de transportes e de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás.

É uma situação esdrúxula, que contraria as diretrizes da política nacional sobre mudança do clima e os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, bem como os esforços para realizar uma transição energética.

Na prática, a distorção normativa apontada é a aplicação de um princípio “poluidor-vencedor”, anticonstitucional e antiambiental.

Aguarda-se a adoção de providências corretivas por parte de legisladores, administradores e reguladores.

Luiz Henrique Lima é doutor em Planejamento Energético e Ambiental, professor e escritor.



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