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Cidades/Geral
Terça - 01 de Janeiro de 2013 às 19:44

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A participação das mulheres nas eleições de outubro atingiu, pela primeira vez, o mínimo de 30% estabelecido por lei, mas a porcentagem das que foram eleitas não chegou nem a 14%. Uma das razões para a diferença é o baixo financiamento de suas campanhas em comparação ao dos candidatos do sexo masculino.

Dos R$ 904 milhões arrecadados por todos os postulantes às prefeituras e Câmaras Municipais das capitais, apenas R$ 96 milhões destinaram-se às mulheres, ou 10,7% do total, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral divulgados em 14 de dezembro.

As mulheres são maioria tanto na população quanto no eleitorado brasileiros.

Uma das explicações para esse cenário é o fato de elas ocuparem, tradicionalmente, menos cargos públicos e de liderança do que os homens, o que prejudica sua capacidade de atrair grandes doadores. “Os homens estão há mais tempo e ocupam mais espaços de poder, que formam também canais de capital político”, explica a socióloga Clara Araújo, coordenadora do Núcleo de Estudos sobre Desigualdades Contemporâneas e Relações de Gênero da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) .

A lei exige também que os partidos dediquem 5% dos recursos do fundo partidário para a “criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres” e 10% do tempo de propaganda gratuita na TV e no rádio para as candidatas. É preciso agora, segundo a socióloga, fiscalizar a aplicação da lei. “Os partidos têm que investir mais, e a gente tem que ver se a lei é cumprida.”

Apesar de o número de postulantes do sexo feminino ter aumentado desde que a lei foi alterada para garantir a candidatura de 30% de mulheres, em 2009, o número de vereadoras e prefeitas eleitas praticamente estagnou.

Nas 26 capitais, apenas 104 dos 811 assentos disponíveis nas câmaras legislativas municipais foram conquistados por mulheres –12,8% do total. Na disputa às prefeituras, 28 mulheres se candidataram, mas apenas Teresa Surita (PMDB) foi eleita, em Boa Vista (RR).

EFEITO DILMA

De acordo com Rosângela Rigo, da Secretaria de Políticas para Mulheres, a chegada de uma mulher à Presidência, em 2010, representou um passo importante em direção à maior igualdade de gêneros na política. “A eleição da presidenta Dilma [Rousseff] ajudou a construir no imaginário da população brasileira uma mudança de que as mulheres também podem ocupar espaços de poder”, afirma.

José Eustáquio Diniz Alves, professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), é mais cético. Para ele, um dos entraves à maior participação feminina é a organização interna dos partidos políticos. Nenhuma das 30 legendas existentes é presidida nacionalmente por uma mulher.

“Se não mudar essa estrutura, vai ser muito difícil conseguir que os partidos indiquem mulheres com capacidade de disputa eleitoral”, diz Alves.

Ana Luiza de Figueiredo, presidente municipal do PSTU –partido que teve a maior porcentagem de mulheres entre os candidatos no país–, diz que a maioria das legendas utiliza “critérios de opressão” existentes.

“Para justificar salários desiguais, existe a ideologia de que as mulheres são piores, e os partidos reproduzem essa ideologia”, diz ela, que foi candidata à Prefeitura de São Paulo em outubro.

Em duas capitais, nenhuma mulher conseguiu uma vaga na Câmara. Em Florianópolis, pelo segundo mandato consecutivo, não haverá mulheres entre os 23 vereadores. Dos 335 candidatos, 104 eram do sexo feminino. O cenário é parecido em Palmas (TO), que, com 88 mulheres entre 290 candidatos, não elegeu nenhuma vereadora. Em 2008, duas mulheres foram eleitas.

A dificuldade das candidatas em vencer a disputa se reflete na hora de conseguir financiamento para as campanhas. Para a deputada federal Luiza Erundina (PSB), 78, como a vitória eleitoral de uma mulher é mais remota que a de um homem, “é evidente que os empresários preferem investir em candidatos homens”. “Em geral, quando as empresas se dispõem a financiar ou apoiar uma candidatura, é sempre dentro da perspectiva de que o interesse da empresa ou do segmento vai ser atendido por aquele representante, por aquele parlamentar”, continua.

A vereadora eleita para a Câmara de Fortaleza, Lucimar Vieira Martins, conhecida como Bá, já havia disputado o cargo três vezes antes de conseguir se eleger. Neste ano, sua arrecadação foi a sexta menor entre os candidatos eleitos, e os R$ 19.341 que financiaram sua campanha vieram de uma empresa do bairro onde vive há 40 anos e é líder comunitária há 20. Apesar da dificuldade de se financiar, ela diz não sentir preconceito por parte dos eleitores. “O eleitor brasileiro está mudando, está votando pelo trabalho realizado e não por outras coisas.”

A jornalista Jô Ramos, candidata a vereadora pelo PT do Rio de Janeiro, recebeu 99 votos que lhe renderam o cargo de suplente e diz que enfrentou dificuldades em obter financiamento para sua campanha. Toda a sua arrecadação (R$ 8.448) veio do comitê municipal do partido. “Só querem dar dinheiro para quem vai ganhar. São os mesmos que há 200 anos fazem política no Brasil”, afirmou.

PROPOSTAS DE MUDANÇA

Para resolver o problema da desigualdade financeira das campanhas, Rigo defende o uso do financiamento público, que “coloca em pé de igualdade todas as pessoas que estão disputando as eleições”.

Outra saída seria o uso de listas fechadas para as eleições de cargos proporcionais. Nesse caso, o eleitor vota na legenda e não no candidato. As cadeiras obtidas por cada partido são preenchidas de acordo com uma lista criada pelo partido, obedecendo a cotas por gênero. Segundo Araújo, seria uma solução porque “não leva à competição intrapartidária, que favorece quem já tinha um cargo”.

Para além das mudanças na legislação, é necessário mudar a organização dos partidos políticos. Segundo Erundina, “nenhum desses partidos tem uma política orientada a capacitar politicamente as filiadas e as militantes e, portanto, há um deficit de experiência política e de condições objetivas para disputar com os homens, internamente nos partidos e nas disputas gerais”.

Angela Albino (PC do B), deputada estadual de Santa Catarina e candidata derrotada à Prefeitura de Florianópolis, vê a necessidade de uma “melhor articulação do movimento de mulheres com as mulheres que são lideranças dentro dos partidos”. A deputada também afirma que é preciso que “os partidos se disponham a dar mais espaço e protagonismo para as mulheres”.

Segundo Alves, do IBGE, “se mais mulheres tiverem capital político, cargos de representação e acesso à mídia, conseguirão arrecadar mais fundos. Mas sem arrecadar fundos, não tem jeito de se eleger. As campanhas são muito caras”.






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