Dia do pai fora da loja
O lojista que é pai comemorou em dobro o domingo, porque na sociedade consumista sentimentos são substituídos por presentes materiais; emoções são substituídas por compras. O lojista faturou porque o pai ganhou presentes. Se meu pai fosse vivo, eu não perderia meu tempo em loja; desfrutaria meu tempo com ele. Contaria como o exemplo que ele me deu de trabalho e de relações humanas me abriu portas no mundo. Contaria a ele que foi muito útil mostrar que o trabalho é fonte de alegrias e de saúde física e mental. Lembraria a ele que as dificuldades financeiras da minha infância e juventude formaram o costume de poupar e não esbanjar. Por fim, diria a ele que, como pai, cumprira a missão.
O mundo inteiro comemora o Dia do Pai. Em datas diferentes. Começou na Babilônia, há quatro mil anos. No Brasil, começou em 1953. Nos países de língua inglesa, é no terceiro domingo de junho. Os portugueses comemoram em 19 de março, dia de São José.
Minha filha mais velha me mandou duas garrafas de vinho, um malbec e um sirah. Foi um bom presente para o pai que bebe vinho todas as noites nos últimos 30 anos, mas o maior presente desse ano foi que ela assumiu ainda mais compromissos na empresa de telefonia em que trabalha, cuidando do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. A dedicação dela ao trabalho, com humor permanente, é presente que também ela recebeu de meu pai.
Meu filho homem, o caçula, me deu uma bela camisa, de uma loja do shopping em que brilha estagiando como homem de marketing. Mas o maior presente foi ter renascido no início da semana de um acidente gravíssimo. Deu-me o presente de comprovar que eu estava certo na escolha de um carro em que o item principal fosse a segurança. Capotando na estrada a 140 km/h e depois caindo na ribanceira, o carro o envolveu na cápsula de sobrevivência e ele não sofreu um arranhão sequer. O dispositivo pirotécnico retesou o cinto e o imobilizou, o air-bag protegeu a cabeça e o rosto - ele sequer quebrou os óculos; o volante afastou-se do tórax e abdome, o para-brisa quebrou mas ficou preso ao plástico; o tanque fechou a gasolina, o motor se projetou para baixo, a gaiola de aço deixou o habitáculo dele intacto. O carro se perdeu todo.
A vida se preservou toda. Foi um presente na semana do pai.
Minha filha do meio não comprou presente algum. Nem precisava. Na sexta-feira, deu-me o presente maior: realizou o sonho de ir para a TV e trabalhar em esporte. Não precisou de nepotismo nem pistolão do pai. Nem teria. Alfabetizada em inglês, foi aprender italiano em Roma e espanhol em Barcelona. Ama esporte e jornalismo. Estagiou em Nova Iorque, virou cidadã do mundo e depois de submetida a perguntas sobre esportes, esportistas do mundo inteiro, conquistou o lugar.
Os três estão felizes no que fazem e mostram que um pai separado nunca é separado dos filhos. Não há loja que tenha nas prateleiras esse tipo de presente para o Dia dos Pais.
Alexandre Garcia é articulista político e escreve em A Gazeta. E-mail: alexgar@terra.com.br
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