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Opinião
Sexta - 15 de Janeiro de 2010 às 12:52
Por: Alessandro Rodrigues

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Fechem os olhos por um instante... Imaginem, agora, um terrível incêndio... Vidas e patrimônios entregues à própria sorte... Imediatamente, o que pensamos? Qual a nossa reação mais sensata? Certamente, solicitar ajuda... Pedir socorro... Acionar a emergência do Corpo de Bombeiros! Eis o ponto onde queremos chegar e que julgamos da maior importância para a solução de muitos problemas de (in) segurança pública, inclusive os ambientais. Afinal, o fogo sem controle apavora, fragiliza, remete-nos às piores sensações.

Pouco importa seu adjetivo, se residencial ou predial, veicular ou florestal; incêndio é incêndio em qualquer lugar, em qualquer circunstância, e não nos deixa outra saída a não ser enfrentar sua fome impiedosa com profissionalismo e competência. Apesar desse estereótipo justo e perfeito, que une homens e mulheres do fogo ao fogo, não é bem assim que as coisas vêm acontecendo floresta adentro, longe dos olhos da sociedade, em especial na Amazônia.

A cada estiagem testemunhamos a ocorrência de incêndios florestais nesta região cuja solução encontrada para tanto, além de violar o ordenamento jurídico nacional, não passa de puro charlatanismo ambiental, praticado à luz do dia e de forma deplorável, com o objetivo pérfido de obstruir recursos públicos e, assim, minar a sagrada missão dos Corpos de Bombeiros.

Em nenhum momento o texto constitucional atribui, abre exceção ou terceiriza a segurança pública a forças alienígenas! Isto que dizer que toda organização que se aventura a combater, por iniciativa própria, um incêndio florestal, modificando, inclusive, a cena do crime, como se a ocorrência por ali estivesse terminada, se torna, de fato, uma força irregular!

Quer prevenindo a sociedade deste tipo penal, quer restaurando a ordem pública diante deste vulcão em atividade, cabe aos Corpos de Bombeiros a tarefa constitucional de gerir o fogo sobre todo o território nacional, nas suas diferentes formas, inclusive, a florestal, e não às milícias ambientais ora instituídas à revelia, conforme o grau de boçalidade dos seus dirigentes de plantão!

Toda a credibilidade dos Corpos de Bombeiros vem sendo depreciada, por conta de uma série de instituições paralelas e concorrentes, inclusive entre si mesmas, que se instalaram dentro de autarquias do governo federal, e que preferem aterrorizar a população com imagens póstumas da natureza a cumprir a lei propriamente dita.

Atualmente, há pelo menos três ministérios discursando sobre um mesmo tema: incêndio florestal... Até aí tudo bem... A ideia é essa mesma e quanto mais, melhor! Mas o que era para ser um sistema cíclico, aberto, dinâmico, com capacidade para auscultar a sociedade, identificar lacunas e retroalimentar-se de informações, inclusive promovendo políticas sociais suplementares, perdeu-se no vazio, no discurso aleatório e não vingou; pelo contrário, sucumbiu.

Também pudera! O núcleo sistêmico foi implantado em ventre alheio... Um erro crasso que privou o Ministério da Justiça e a Secretaria Nacional de Segurança Pública do direito à convivência e do dever de cumprir responsabilidades fundamentais.

Em seu lugar fizeram surgir, pasmem, sob a mesma identidade, uma estrutura que, de maneira incontida e voraz, autônoma e ilegal, passou a recrutar, uniformizar e contratar mão-de-obra não especializada, submetendo-a à própria sorte e à periculosidade do ofício, como se bombeiros fossem... E, pior, sem eficácia alguma!

Quando a constituinte elencou os órgãos de segurança pública sob os pilares do artigo 144 delegaram atribuições e não feudos, cada qual na sua especialidade, no seu limite funcional, e os cristalizou como sendo um só organismo cujo objetivo é a paz social!

Imaginem o Corpo de Bombeiros não podendo passar sobre uma rodovia federal, porque lá o ostensivo cabe a Polícia Rodoviária Federal... Agora, imaginem um acidente de trânsito com vítima (s) presa (s) nas ferragens... Como fica? Quem irá resgatá-la (s)? Quem responderá pela omissão do socorro? A única diferença é que a Polícia Rodoviária Federal, além de órgão competente de segurança pública, não se prende a mesquinhez e nem a miopia de quem deveria zelar pela lei e suas instituições!

Eis, senhoras e senhores, a política nacional do abafador e do pinga-fogo! A solução mais genial encontrada até o presente momento pelo governo federal! Como se a Amazônia, pela sua grandeza e por tudo o que representa ao planeta, não merecesse respeito e coisa melhor!

Enquanto o ministério da justiça promove campanhas de desarmamento como parte de uma estratégia primaz na redução de crimes contra a vida, em especial, o homicídio, o ministério do meio ambiente faz exatamente o contrário com o crime de incêndio florestal.

Sinceramente, não conseguimos distinguir a diferença entre um abafador e um colete à prova de balas, muito menos a diferença entre um pinga-fogo (queimador) e uma arma de fogo, se os efeitos psicológicos provocados na sociedade são idênticos e só fazem banalizar ainda mais a violência perversa do cotidiano.

Como podemos facilmente perceber, a entropia e o desvio de finalidade vêm particularizando a Amazônia e provocando, sobretudo, o sucateamento dos Corpos de Bombeiros dos Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Maranhão, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, cuja soma de todo efetivo existente se aproxima do número de bombeiros encontrados, por exemplo, no Distrito Federal.

Definitivamente, o Brasil não está preparado para enfrentar um incêndio florestal de grandes proporções na Amazônia, como já não estava em Roraima, em 1998.

Naquela época, a solução encontrada frente ao descontrole do fogo foi implorar à pajelança Caiapó. E de lá para cá as coisas pioram... El niño, mudanças climáticas, aquecimento global, efeito estufa, savanização da floresta, pressão antrópica, impunidade, pouco investimento, baixa tecnologia... Tudo isso só fez aumentar ainda mais o risco!

E assim estamos... Presenciando uma Amazônia desprevenida e insegura, e sonhando com um tempo onde as coisas por aqui não serão mais tratadas a ferro e a fogo, muito menos sobre o lombo de um pangaré...

Alessandro Mariano Rodrigues, é tenente-coronel do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Mato Grosso, especialista em segurança pública e incêndio florestal e coordenador das Brigadas Indígenas. mariano@bombeiros.mt.gov.br



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