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Opinião
Segunda - 31 de Março de 2014 às 08:37
Por: Luiz Henrique Lima

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Vez por outra encontro algum enrustido saudosista da ditadura militar. É fácil reconhecê-los. São aqueles que diante de qualquer notícia negativa - seja na área econômica, seja um escândalo de corrupção, seja um crime espetacular, seja um atraso no trânsito ou um buraco na calçada- estão sempre a postos para comentar que no tempo dos milicos não era assim, que se os militares voltassem a mandar as coisas entrariam nos eixos etc. 

Não quero acreditar que tais indivíduos sejam ignorantes da história pátria ou conscientemente partidários da extrema-direita. Creio que pelo menos a grande maioria não é nada disso. São provavelmente apenas desinformados ou distraídos. Em sua homenagem, escrevi o artigo de hoje. Ditadura, meus caros, nunca é bom para um país ou um povo. Suas aparentes vantagens são ilusórias e suas consequências são terríveis e duradouras. A ditadura de 1964 não fugiu à regra. Seu balanço histórico é desastroso sob todos os aspectos. 

Prendeu, exilou, baniu, torturou, matou, censurou, proibiu, reprimiu, mentiu, roubou muito e fracassou redondamente. No campo político, cassou representantes legítimos eleitos pelo povo, além de juízes, professores e cientistas. Impediu o exercício de direitos básicos da cidadania, como os de expressão e de associação. Podou o surgimento de novas lideranças e cevou oligarquias corruptas que até hoje controlam importantes nacos da administração pública. 

"Não se aprende a andar de bicicleta com as pernas amarradas, e sim pedalando, caindo, levantando e tornando a pedalar"

Nos seus calabouços, inúmeros crimes foram praticados e monstruosas tragédias arquitetadas, como os atentados do Gasômetro e do Riocentro, que só não ceifaram milhares de vidas civis num caso pela coragem dos heróis do Para-Sar e noutro pela incompetência dos executores. No campo social, resultou em décadas de atraso na educação, na distribuição de renda, na mortalidade infantil e em diversos outros indicadores de desenvolvimento humano em que o Brasil ocupou os últimos lugares no planeta e que somente começaram a evoluir a partir de 1983 com a posse de governadores eleitos pelo voto direto. 

Na área cultural, seu legado é o ridículo que transformou oficiais das Forças Armadas, originalmente vocacionados para a nobre missão de defesa nacional, em patéticos censores que decidiam quais músicas poderiam ser tocadas, quais filmes exibidos, quais peças teatrais encenadas e até quais pinturas poderiam ser expostas em galerias de arte. Livros foram queimados e proibidos, redações de jornais invadidas e até narradores esportivos estiveram sob vigilância para que não ameaçassem a segurança nacional. 

É na área econômica que o discurso saudosista é mais mentiroso. Apesar do suposto milagre, o que restou foi o monstruoso endividamento, o descontrole inflacionário e o enriquecimento de alguns poucos grupos privilegiados pelas benesses de contratações, concessões e financiamentos. Claro que algumas obras foram executadas, mas em volume menor e a um custo muito maior, por exemplo, do que as dos governos de Getúlio Vargas ou Juscelino Kubistchek. 

A ditadura concentrou renda entre regiões e classes sociais, além de disseminar a corrupção como uma metástase em todas as esferas de decisão da política econômica. A ditadura é o ambiente em que vicejam sem controle e impunes as piores paixões humanas: a delação, a traição, a ambição, a vingança e a tortura. Por isso, como Ulysses Guimarães, proclamo: tenho ódio e nojo da ditadura! De todas elas! Nossa jovem democracia tem muitos problemas? Sim, sem dúvida e graves problemas. Mas o caminho para o seu aprimoramento é mais democracia ainda. 

Não se aprende a andar de bicicleta com as pernas amarradas, e sim pedalando, caindo, levantando e tornando a pedalar. Um ambiente poluído não é saneado fechando-se as janelas, mas escancarando-as. O pior presidente eleito diretamente não causou tanto dano ao país quanto o melhor dos generais ditadores. Portanto, senhores saudosistas distraídos, tenham paciência, mas ditadura nunca mais!



Autor

Luiz Henrique Lima

LUIZ HENRIQUE LIMA é conselheiro substituto do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE-MT)

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