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Opinião
Sexta - 03 de Junho de 2022 às 06:50
Por: Renato Gomes Nery

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Os olhos tristes de uma atendente do caixa de supermercado me chamaram atenção. Perguntei seu nome ela disse que se chamava Milagros. Inqueri se ela era estrangeira e ela me respondeu que era venezuelana.

É muito comum encontrar venezuelanos por aqui, em face da diáspora recente que se abateu sobre aquele País e obrigou grande parte de seus filhos a errarem cegos pelo continente, como diz a canção popular Vai Passar de Chico Buarque.

Os olhos são o retrato da alma. Eles não conseguem esconder a dor, alegria, a desesperança, a tristeza ou outro sentimento que se abate sobre as pessoas.

Eles não negam! Os olhos desesperados dos imigrantes que tiveram de abandonar compulsoriamente a terra em que nasceram são reveladores. A melancolia (banzo) é um estigma manifestado pelos olhos tristes do exílio de boa parte dos descendentes de escravos negros, no Brasil.


Milagros sonha diuturnamente em retornar, pois o exílio lhe é penoso. Ela ainda se sente uma estrangeira. Sonha com seus pais, parentes, amigos, costumes e com as paisagens e lugares que deixou para trás, a fim de encontrar uma vida melhor aqui no Brasil, mas a sua estada está se prolongando e ela não tem certeza se voltará para a sua amada terra.

Saudade talvez seja uma das palavras que expressa com mais fidelidade os penosos dissabores dos imigrantes. É um sentimento sem tradução precisa, pois faltam palavras para expressa-lo. Mas o poeta sabe fazê-lo com maestria e talento.

Minha terra tem palmeiras
Onde canta o Sabiá,
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá......

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores....

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá (Canção do Exilio – Gonçalves Dias).

Eu sou filho de migrantes. Sempre existiu, na minha casa, um certo pesar do que ficou para trás sem remissão. Um pertencimento que nunca abandonará quem partiu. O filme Gaijin – Caminhos da Liberdade de Tizuka Yamazaki - retrata, com fidelidade, os dessabores dos japoneses que imigraram para o Brasil, no início do século XX, e queriam desesperadamente voltar. Foi preciso que se renovassem as gerações para este “voltar” se esvaísse e a dor adormecesse.

Que Deus detenha os violentos e estenda as mãos sobre a Ucrânia e faça cessar o flagelo da guerra para que sua população desesperada não tenha mais que abandoná-la, com uma mão na frente e outra atrás.

Milagros! Eu espero que o seu nome inspire o Criador e ele atenda às suas súplicas e a leve de volta sã e salva para a sua amada Venezuela. Ou que você se estabeleça definitivamente aqui e que seja feliz nesta nova pátria.

Renato Gomes Nery é advogado.



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