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Opinião
Quarta - 22 de Junho de 2022 às 09:47
Por: Gaudêncio Torquato

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A morte de Bruno Pereira e Dom Phillips afunda de vez a imagem do Brasil na esfera internacional. Uma crueldade. Barbarismo. Ausência do Estado na região amazônica. Um país campeão de violência. E uma pregação irresponsável do maior dirigente do país, que atribui a culpa das mortes às próprias vítimas. "O que estavam fazendo lá?" "O jornalista era malvisto na área." Quanta insanidade!

Antes de o leitor terminar de ler este segundo parágrafo, dois cidadãos estão tombando ou sendo assaltados nos vastos espaços do território nacional, vítimas da bandidagem.

De 5 doentes que baixam nos hospitais brasileiros, pelo menos 1 é vítima de uma "guerra civil" que mata por ano mais de 58 mil brasileiros (em 2018, registraram-se 57.956 homicídios; nos EUA, em 2020, primeiro ano da pandemia de Covid-19, ocorreram 19.350 homicídios por arma de fogo). O Brasil é campeão.

Em todos os recantos, o retrato do descaso se apresenta, ornamentado com gigantesca galeria de mortos

Outro olhar é para o empobrecimento do país. Dado recente: 33 milhões de brasileiros passam fome, enquanto outros 30 milhões descem à base da pirâmide, de onde haviam saído para a classe C nos últimos anos. Nestes tempos de milícias e grupos organizados, a farra com o dinheiro do povo continua — basta ver o orçamento para gastos com a campanha eleitoral, de cerca de R$ 5 bilhões.

Os assassinatos do indigenista Bruno e do jornalista inglês Dom, no Vale do Javari (AM), escancara a triste realidade: o Brasil não administra seus limites territoriais. Parcela ponderável da Amazônia brasileira está sob controle de cartéis de drogas, garimpeiros, madeireiros, bárbaros que devassam a floresta.

Em todos os recantos, o retrato do descaso se apresenta, ornamentado com gigantesca galeria de mortos.

O quadro é aterrador: bandidos assaltando, dominando morros no Rio de Janeiro, matando pessoas; policiais matando bandidos; bandidos matando policiais; bandidos roubando o dinheiro de companheiros presos; vez ou outra, motins nos cárceres apinhados; estupros e mortes violentas. A Amazônia brasileira? Terra sem lei.

O clima de insegurança e medo só é mesmo comparável aos descritos nos filmes de ficção científica, onde robôs armados até os dentes, com todo o aparato tecnológico, não conseguem desbaratar quadrilhas mancomunadas com a polícia, conter o ímpeto de galeras enfurecidas ou o arrojo de súcias de bandidos.

A brutalidade jorra em proporção geométrica, e as paliativas soluções governamentais —melhoria e ampliação do sistema penitenciário, reforço e reaparelhamento das polícias, reforço às estruturas de assistência aos povos indígenas— não passam de lorotas.

O beabá para combater a violência deve começar com o desfazimento da cosmética de miséria que se instalou no país. Os cinturões metropolitanos, já saturados de lixões que ofertam um banquete pantagruélico para urubus, crianças e mães famintas, são também palco para a exibição de corpos chacinados em decomposição, vítimas do ciclo de violência destes tempos horripilantes.

O que se vê é a expansão dos contingentes das ruas, esmoleres e mendigos, que passam a noite embaixo de pontes e viadutos, cobertos por caixas de papelão.

O tal Auxílio Brasil, de R$ 400, não cobre a despesa alimentar. Milhões de famílias foram expulsas da rede assistencial. A inflação pode atingir, logo mais, 15% ao mês, apenando mais ainda os miseráveis. E o ministro da Economia, Paulo Guedes, fala do Brasil como se fosse uma ilha de segurança em um oceano global revolto.

Nestes tempos armados, os bárbaros se multiplicam pelos espaços, formando um império do "poder informal". Norberto Bobbio, em seu clássico "O Futuro da Democracia", já dizia: a eliminação do poder invisível é uma promessa não cumprida da democracia. Poder que age nas entranhas do Estado.

Sem ânimo, emoções envenenadas, os cidadãos se veem acossados pela violência, entram em um limbo catatônico, assemelhando-se a dândis em passeio macabro e estonteante por um jardim de horrores. A violência suga a vitamina da vida, a alegria de viver. Ao fundo, a sombra do vírus da pandemia em sua quarta visita ao nosso habitat.



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