Repórter News - reporternews.com.br
Opinião
Quinta - 04 de Maio de 2023 às 03:45
Por: Jackeline da Graça Bastos

    Imprimir


Em abril de 2023 foram divulgados os resultados de um levantamento realizado nos Estados Unidos que apontam que a prevalência de pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) é de 1:36, isto é, a cada 36 pessoas, uma é autista.

Não existem dados parecidos sobre o Brasil ou sobre Mato Grosso, mas podemos supor que a proporção seja parecida. Nos últimos anos o número de pessoas diagnosticadas vem aumentando e os temas relacionados ao autismo têm ganhado mais visibilidade.

Existe uma discussão questionando se o número de pessoas com autismo está aumentando ou se é o número de diagnósticos que está aumentando.

Existem autores que argumentam que as duas coisas estejam acontecendo ao mesmo tempo. Não se sabe ao certo se a mudança se deve ao maior acesso à informação tanto por parte de familiares de pessoas autistas quanto por parte de profissionais que percebem os primeiros sinais de atraso no desenvolvimento - especialmente os professores de educação infantil e médicos pediatras - e ajudam a dar o start no processo de diagnóstico. Junto com o aumento de casos diagnosticados, aumentou também - certamente não de forma proporcional - o acesso aos direitos das pessoas com TEA e de suas famílias.


Em Mato Grosso podemos citar a lei estadual 11.909/2022 que institui a política de atendimento à pessoa com TEA e aos seus cuidadores.

Os serviços públicos oferecem algum suporte no sentido de manejar situações de crise nos CAPS e na rede de saúde mental de forma geral.

Porém, existe a recomendação de profissionais da área de que pessoas com TEA sejam atendidas por equipe multidisciplinar e especificamente recebam intervenção ABA. Esta terapia tem demonstrado mais evidências de eficácia e é tradicionalmente utilizada para ampliação de habilidades para pessoas com atrasos de desenvolvimento de forma geral.

A ABA (Applied Behavior Analysis, em inglês) é a parte aplicada de uma ciência complexa com bases filosóficas próprias e tradição na experimentação científica.

A ABA leva em consideração o repertório comportamental de cada paciente ao elaborar uma intervenção. Em geral, os pacientes que recebem intervenções ABA podem realizar uma carga horária extensa de terapia, isso porque é necessário estabelecer objetivos em diversas áreas do desenvolvimento e em diversos contextos como clínica, casa, escola e outros contextos de grupo, por exemplo, podendo chegar até a 30 ou 40 horas semanais.

Com o aumento no número de diagnósticos, aumentou também a procura por serviços especializados. O aumento da demanda tornou muito rentável ser um profissional que oferece intervenção ABA.

Em um levantamento informal foram identificadas mais de 20 clínicas em Cuiabá que oferecem atendimento ABA no final de 2022, sendo que em 2018 existiam apenas duas clínicas oferecendo tal serviço.

A crescente no interesse dos profissionais foi importante porque possibilitou o acesso de muitas famílias que antes permaneciam por meses em filas de espera dos poucos serviços existentes, por outro lado foi caracterizada pela ocorrência de profissionais pouco capacitados ou inexperientes oferecendo o serviço.

Como profissionais, além de oferecer apenas serviços para os quais estamos capacitados, é nosso dever informar ao paciente ou aos seus cuidadores sobre o que define um serviço ABA de qualidade.

A Associação Brasileira de Análise do Comportamento (ACBr) divulgou em 2019 algumas perguntas importantes que pais ou cuidadores podem fazer aos profissionais que atendem seus filhos. Dentre elas qual é a formação do profissional, quanto tempo ele tem de experiência na área, se ele costuma ler artigos científicos ou participar de congressos da área para se manter atualizado.

A Associação Brasileira de Ciências do Comportamento (ABPMC) anunciou neste mês que está elaborando uma certificação para profissionais que trabalham com ABA.

Provavelmente os resultados desta ação serão visíveis a longo prazo, mas um dos objetivos de existir um controle nesse sentido é proteger pacientes e cuidadores de procedimentos abusivos, desrespeitosos ou ineficazes.

Os critérios para a nova certificação ainda não foram divulgados, mas é sabido que as exigências são relacionadas à formação dos profissionais e à prática supervisionada, por exemplo.

Com o aumento de casos diagnosticados como TEA, aumentou também o número de profissionais interessados em oferecer atendimento especializado.

O aumento da demanda tornou rentável para profissionais com ou sem uma boa formação oferecer esse serviço. Dessa forma os pacientes e familiares ficam sujeitos a receberem um atendimento pouco efetivo ou até abusivo.

É direito do paciente e de seus tutores ter acesso às informações sobre como o serviço funciona e principalmente sobre como reconhecer um serviço ABA de qualidade.

Jackeline da Graça Bastos é psicóloga pela UFMT.



Comentários

Deixe seu Comentário

URL Fonte: https://reporternews.com.br/artigo/5262/visualizar/