Mortos pela chuva. Até quando?
O Brasil convive, nas últimas décadas, com a tragédia das águas. O inchaço urbano, a ocupação predatória de várzeas e encostas e a impermeabilização irresponsável das terras junto aos cursos d’água, constituem a mortal alavanca do caos. A água da chuva, antes absorvida por ruas e quintais de terra e contidas pela vegetação, hoje rola rápido para o fundo do vale. E ainda leva para o leito do rio grande volume de lixo, restos de construção, peças, móveis e objetos criminosamente descartados. Insuficientes para receber essa grande descarga, os córregos, riachos e rios transbordam, invadindo prédios, alagando ruas e arrastando veículos, pessoas, vidas e tudo o que encontram em seu trajeto.
A natureza agredida cobra caro dos seus agressores. Daí os milhares de mortos, as doenças, os elevadíssimos prejuízos materiais e todo o desconforto e trauma resultantes da inobservância às regras ambientais. Até quando as autoridades e a sociedade continuarão fazendo vistas grossas ao problema? Não bastam discursos de campanha e sob o impacto das tragédias. A população é testemunha que, apesar das promessas e da propaganda enganosa de governos e ONGs interesseiras, a cada ano, o problema se apresenta mais grave. Áreas de risco continuam ocupadas – muitas vezes com a conivência das próprias autoridades – e ninguém consegue remover os invasores, muitos dos quais só saem mortos.
O Brasil, como oitava economia do mundo, com pretensões de logo tornar-se a quinta, não é mais aquela pobre e atrasada “república de bananas”. Possui centros técnicos e culturais e parque instalado capazes de produzir grandes obras e, se tiver interesse, ainda consegue apoio internacional para promover o necessário reequilíbrio hídrico-ambiental. Além das obras, necessita remover as populações em risco e dar-lhes suporte social e educacional. Para tanto, é preciso ter vontade política e não praticar a clássica politicalha, onde o governo que entra costuma parar as obras do governo que sai, como forma de retaliação. A vida da população e a sustentabilidade são mais importantes do que a política.
Existem, pelo mundo, muitos bons exemplos de emprego correto da técnica e dos recursos. O Rio Tennessee, nos Estados Unidos, é um deles. Sua calha, antes palco de desastrosas enchentes, hoje é um vale de prosperidade e equilíbrio. Mas foram necessários 30 anos de trabalhos e investimentos seguidos. Em São Paulo, o Tietê, cujo aproveitamento se fez com base no projeto do Tennessee, tem obras há mais de 30 anos, mas ainda patina em gargalos resultantes da descontinuidade. Por isso, continua causando enchentes na principal cidade do país e apresenta sérios problemas por todo o interior paulista.
Os novos governos, se quiserem, encontram, principalmente nos Estados Unidos e Europa, bons parâmetros sobre controle hídrico, despoluição de rios, desenvolvimento regional e até o aproveitamento de áreas próximas ao mar, como na Holanda. Tudo isso já é sabido. São obras de longo prazo, que não podem parar. Sem elas, muitos brasileiros continuarão condenados à morte...
Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
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