Mundo, vasto mundo... Mesmo que eu me chamasse Raimundo, ficaria à mercê de decifrá-lo
Nos meus tempos de infância e de juventude, eu e meus amigos tínhamos uma força indomável que nos compelia a desvendar tudo. O mundo para nós era um enigma a ser decifrado.
Quando não conseguíamos colocar a imaginação em funcionamento, criávamos um universo apartado que púnhamos e dispúnhamos a nosso talante. Entretanto, isto não nos impedia de continuar a empreitada de descortinar o véu que cobria a maioria das coisas.
A curiosidade é que leva o mundo para frente, pois uma coisa leva a outra e, de repente, se alça voos para descortinar o infinito.
Na minha infância, a minha caixa de engraxate e os inúmeros brinquedos eram feitas a mão (s) por mim. As mãos conduzem as pessoas e a vida, pois as usamos para fazer coisas e criar confiança em nós mesmos.
Eu e meus amigos curiosos passávamos horas falando sobre as partes íntimas das mulheres com a imaginação fértil da idade. Os corpos das fêmeas eram cobertos e indecifráveis, o que nos levava a aguçar a imaginação criativa e poderosa. Hoje, eles estão expostos em todos os lugares a desestimular a libido do macho que ficou frouxo.
O isolamento e a falta de comunicação com o mundo exterior levam a tantos outros mistérios e impasses, aparentemente, insolúveis que eu e os da minha geração tínhamos que encarar.
O mundo mudou e mudou muito! Parece, hoje, que tudo foi desvendado e não resta mais nada a se descobrir. E as pessoas, notadamente, as mais novas, não se encantam e não se maravilham com nada.
Uma apatia geral tomou conta de tudo, pois parece não haver mais nada onde se possa estimular e matar a curiosidade que é um patrimônio precioso da juventude.
Tudo foi descoberto ou senão, basta perguntar, sem o menor esforço, para um aparelhinho eletrônico chamado celular. Venceram a imobilidade, a apatia e a lei do menor esforço que não ajudam endurecer cepa das pessoas para enfrentar as vicissitudes de um mundo cada vez mais difícil e mais hostil.
Tento fazer meu filho, minhas filhas e seus amigos a se interessarem por muitas coisas, e uma delas é a leitura, mas não consigo. Eles são imediatistas e não cultivam uma virtude imprescindível: a paciência.
Estou falando no deserto para ouvidos moucos. Enfim, me vejo num impasse que desafia a minha mente inquisitiva. Certamente, vou morrer sem entender milhares de coisas que me desafiaram, desafiam e me incomodam, mas o que foi possível, a minha geração, tentou descobrir.
Mundo, vasto mundo, mesmo que eu me chamasse Raimundo, ficaria à mercê de decifrá-lo. Eis aí a genialidade do poeta que cito com frequência para aplacar a minha, a nossa pequenez frente ao colossal universo.
Mundo, mundo, vasto mundo
Se eu me chamasse Raimundo
Seria uma rima, não seria uma solução
Mundo, mundo, vasto mundo
Mais vasto é meu coração (Poema Sete Faces/Drumond).
Renato Gomes Nery é advogado.
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